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Revista TOMO, São Cristóvão, v. 42, e17893, 2023
DOI: 10.21669/tomo.v42i

Data de Publicação: 10/01/2023
Dossiê: Teorias Críticas Decoloniais

A incorporação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável
16 pelo Judiciário brasileiro: possibilidades e limites à luz de uma

perspectiva decolonial

Paulo Renato Vitória1

Iracy Ribeiro Mangueira Marques2

Resumo:
Este artigo analisa, a partir de uma perspectiva crítica da colonialidade, as possibilidades e os limites de-
correntes da incorporação da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU) pelo Poder Judiciário
nacional, precisamente no tocante ao Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 16. Em um primeiro
momento, elencamos alguns dos principais aspectos normativos referentes à adesão a essa pauta e a recep-
ção do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) como consectários de uma preocu-
pação do órgão de cúpula da Justiça brasileira com a qualidade e aprimoramento da entrega jurisdicional.
Prosseguimos com uma análise crítica acerca da pretensão de universalidade da visão ocidental de direitos
humanos, relacionando-a com o conceito de colonialidade do poder, de Aníbal Quijano (1992). Em seguida,
passamos a problematizar o conceito de desenvolvimento que subjaz o ODS em questão, tomando em con-
ta o capitalismo estruturalmente dependente que caracteriza a nossa região, como também os paradoxos do crescimento econômico enquanto critério implícito na pauta onusiana. Por fim, diante dessas reflexões
e considerando os limites das concepções hegemônicas de direitos humanos e desenvolvimento, propo-mos uma discussão sobre algumas condicionantes estruturais, contextuais e interseccionais que desafiam a
construção de novas metodologias, mediações e ferramentas que possam permitir a integração dessa pauta
pelo Judiciário. Apontamos alguns possíveis caminhos horizontais, dialógicos, transmodernos e pluriversais, coerentes com as particularidades, as contradições materiais e as especificidades da realidade brasileira.
Palavras-chave: Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Poder Judiciário. Aprimoramento da
prestação jurisdicional. Colonialidade. Pluriversalidade.

1 Em estágio Pós-Doutoral (PNPD/CAPES) na Universidade Tiradentes. Programa de Pós-Graduação em Direito; Aracaju,
Sergipe, Brasil. E-mail: prvitoria@gmail.com. https://orcid.org/0000-0002-2171-8156

2 Mestranda em Direitos Humanos pela Universidade Tiradentes. Programa de Pós-Graduação em Direito; Aracaju, Sergipe,
Brasil. E-mail: iracymangueira@gmail.com. https://orcid.org/0000-0002-2272-2421

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Paulo Renato Vitória; Iracy Ribeiro Mangueira Marques

Introdução

O presente artigo analisa as possibilidades e os limites decorrentes da adesão do Judiciário na-
cional à Agenda 20303 da Organização das Nações Unidas (ONU), precisamente no tocante ao Ob-
jetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 164, à luz de um olhar crítico da colonialidade do
poder (Quijano, 1992), do saber (Lander, 2000) e do ser (Maldonado-Torres, 2007). Assumimos
a hipótese de que a incorporação dessa pauta internacional pelos países periféricos5 pode servir
tanto para impulsar o aprimoramento da política judiciária e de combate às distintas hierarquias
(sociais, raciais, ambientais, de gênero, etc.) do padrão colonial de poder (Quijano, 1992) quanto
para perpetuá-las, caso não sejam aplicadas desde uma perspectiva crítica e em função das de-
mandas concretas da nossa realidade periférica.

O problema de pesquisa pode ser desdobrado nas seguintes proposituras, que servem de pano de
fundo para a nossa argumentação: como dispor de marcos teóricos que permitam uma concepção
de governança e desenvolvimento que sirva de contraponto à concepção universalista consagrada
pela ONU? É possível falar em desenvolvimento sustentável sem aprofundar a discussão a respei-
to das contradições materiais estruturais inerentes ao moderno sistema-mundial (Wallerstein,
2012) e à racionalidade liberal-individualista (Hinkelammert, 2003) do Ocidente? Em que medida
os próprios conceitos de direitos humanos e desenvolvimento (e suas variantes, como o “desenvol-
vimento sustentável”) podem ser considerados como ferramentas emancipatórias, e não instru-
mentos de perpetuação das múltiplas hierarquizações da modernidade/colonialidade capitalista
e patriarcal? É possível uma apropriação crítica e emancipatória desses conceitos? Quais as possi-
bilidades de avanços a partir da incorporação desse ODS pelo Poder Judiciário brasileiro, levando
em consideração uma perspectiva crítica e decolonial6, como a que propomos neste trabalho?A metodologia utilizada possui um caráter qualitativo, de procedimento bibliográfico e documen-tal e o texto está estruturado em quatro partes, além desta introdução e das considerações finais.
Em um primeiro momento, correlacionamos a adesão à pauta da ONU e a recepção do Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) como consectários de uma preocupação do
órgão de cúpula do Judiciário brasileiro com a qualidade e aprimoramento da entrega jurisdicio-
nal, por meio de uma análise descritiva das principais medidas tomadas nessa direção nos últimos
anos. No tópico seguinte, prosseguimos com uma análise crítica acerca da pretensão de univer-
salidade da visão ocidental de direitos humanos, relacionando-a com o conceito de colonialidade
do poder, de Aníbal Quijano (1992). Em seguida, passamos a problematizar, dentro da mesma

3 De acordo com a página institucional da ONU, “As Nações Unidas lançaram sua agenda de desenvolvimento sustentável em 2015, refletindo o crescente entendimento dos Estados Membros de que um modelo de desenvolvimento sustentável para
esta e futuras gerações oferece o melhor caminho para reduzir a pobreza e melhorar a vida das pessoas em todos os luga-
res. Ao mesmo tempo, as mudanças climáticas começaram a causar um impacto profundo na consciência da humanidade.
Com o derretimento das calotas polares, o aumento global do nível do mar e a ferocidade dos eventos climáticos cataclísmi-
cos, nenhum país do mundo está a salvo dos efeitos das mudanças climáticas” (United Nations, s. d., n.p., tradução nossa).4 “Objetivo 16. Promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis” (Organização das Nações
Unidas, 2012, n.p.).

5 Para Wallerstein (2012, p. 26, tradução nossa), “podemos denominar «periferia» a zona perdedora e «centro» a ganhadora. Estes
nomes refletem, de fato, a estrutura geográfica dos fluxos econômicos”.

6 Nos referimos aqui à perspectiva teórico/conceitual desenvolvida por diversos autores e autoras latino-americanos nas úl-timas décadas, identificados como uma matriz de pensamento “decolonial”, que – apesar das diferenças internas – possuem
em comum o reconhecimento, como premissa de análise, da existência de um padrão mundial de poder capitalista que tem como elemento constitutivo e específico a “colonialidade do poder”, proposta teórica originalmente formulada por Quijano
(1992), que será explicada mais adiante.

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A incorporação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável

perspectiva teórica de matriz decolonial, o conceito de desenvolvimento que subjaz o ODS em
questão, tomando em conta o capitalismo periférico e dependente que caracteriza a nossa região, como também os paradoxos – sobretudo ecológicos – do crescimento econômico enquanto crité-
rio implícito na pauta onusiana. Por fim, diante dessas reflexões, e considerando os limites das concepções hegemônicas de direi-
tos humanos e desenvolvimento, apontamos a horizontalidade, a linguagem dialógica e o pluriver-
salismo de resistência como caminhos a serem trilhados para transcender a verticalização de uma
política de sustentabilidade que desconsidera as necessidades e particularidades de uma grande
parcela da humanidade. Nesse sentido, discutimos algumas condicionantes estruturais e contex-tuais que desafiam mediações, novas metodologias e ferramentas capazes de permitir a integra-
ção dessa pauta pelo Judiciário sem prescindir dos particularismos, das necessidades materiais e
da pluralidade da realidade brasileira.

1. A incorporação da Agenda 2030 pelo Poder Judiciário brasileiroA adesão do Poder Judiciário brasileiro à Agenda 2030 – pauta subscrita por 193 (cento e noventa
e três) países e implementada a partir de ações gestadas por uma governança mediada pelo PNUD – apresenta-se como um compromisso da política judiciária brasileira com a difusão dos direitos
humanos, ainda que compreendidos desde uma perspectiva tradicional, de cunho abstrato e li-
beral (Herrera Flores, 2009). Sua implementação confere legitimidade a um paradigma ético que
congrega um conjunto de direitos, deveres e limites supranacionais alicerçado no trinômio: cres-
cimento econômico, desenvolvimento social e proteção ambiental (Diz, 2019, p. 84):

[...] a construção “top to bottom” que caracteriza o desenvolvimento sustentável demanda a
concretização dos três tradicionais pilares sobre os quais encontra-se alicerçado: alcançar
o crescimento econômico, com proteção ambiental e desenvolvimento social, premissas
básicas que devem nortear toda atuação pública e privada; acrescidos também os funda-
mentos da paz e democracia estabelecidos pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentá-
vel (Diz, 2019, p. 88).

Como consectário lógico desse alinhamento, várias ações, sob a direção do PNUD, estão sendo
gestadas no âmbito do Poder Judiciário brasileiro, notadamente no que concerne à adoção de
planos de aprimoramento da entrega jurisdicional e do exercício de uma governança em rede,
a partir de experiências concebidas em Laboratórios de Inovação, Inteligência e Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável – LIODS (Brasil, 2019), da formação de Comitês Técnicos e da im-
plementação de ações formativas e Fóruns Nacionais, sem descurar das ferramentas que gestam
o controle e o monitoramento da integração ao Judiciário dessa pauta supranacional, por meio
da leitura de indicadores previamente demarcados e que referenciam as políticas em execução.
Dito processo permite, ainda, a ampliação do foco em questões judicializadas que envolvem vio-
lência doméstica, infância e juventude, moradia e diversos outros litígios que incitam a disposi-
ção de processos estruturais e suas respostas complexas, que serão articuladas com as políticas
de promoção social.

Por meio da Portaria n.º 148/2018 (Brasil, 2018), foi criado um Comitê Gestor para a integração
das metas do Judiciário com os ODS da Agenda 2030, merecendo registro a providência adotada de parametrização das autuações processuais (Tabelas Processuais Unificadas – TPU) com os ODS,

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Paulo Renato Vitória; Iracy Ribeiro Mangueira Marques

de modo a permitir, por meio da pertinência temática entre ações distribuídas e os ODS, o diagnós-
tico e o referenciamento estatístico que precedem a elaboração de ações estruturantes7.

Além da parametrização das metas com os ODS, diversos projetos, programas e ações estão sendo
engendrados, como também vários atos normativos foram editados em alinhamento com essa pau-
ta8, o que pode vir a resultar em um enriquecimento do conteúdo das entregas judiciais, mediante a
consecução de uma política judiciária alinhada com a promoção de políticas públicas comprometi-
das com a pauta do desenvolvimento sustentável da ONU. As atribuições do referido Comitê Gestor,
contidas na Portaria n.º 55/2020 (Brasil, 2020, n.p.), estabelecem o escopo de sua atuação:

I – Fazer a interlocução das demandas do Poder Judiciário com os órgãos e atores que con-
tribuem para o plano de ação da Agenda 2030, aprovada pela Assembleia Geral da Organi-
zação das Nações Unidas, da qual o Brasil faz parte, de acordo com o Decreto nº 19.841, de
22 de outubro de 1945;II – Elaborar relatórios estatísticos semestrais de dados, metas e indicadores do Poder
Judiciário relacionados à Agenda 2030
que integrarão a publicação Justiça em Números
e servirão de subsídios para a mensagem anual do Presidente do Supremo Tribunal Federal
a ser remetida ao Congresso Nacional, por ocasião da abertura da sessão legislativa, sobre
a situação do Poder Judiciário no País e as atividades do CNJ;III – Manter repositório das pesquisas acadêmicas e judiciárias relacionadas à Agenda
2030;IV – Elaborar relatório das dificuldades encontradas na obtenção de dados estatísticos de-
sagregados referentes às metas e indicadores da Agenda 2030 à Comissão Permanente de
Acompanhamento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e Agenda 2030;V – Acompanhar o processo de integração da Agenda 2030 no Poder Judiciário;VI – Acompanhar as pesquisas relacionadas aos mecanismos que ampliem a transparência
de dados do Poder Judiciário, facilitando consulta e pesquisa por usuários;VII – Contribuir com a organização anual dos Encontros Ibero-Americanos da Agenda 2030
no Poder Judiciário; eVIII – Contribuir com os trabalhos do Laboratório de Inovação, Inteligência e Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (LIODS) e propor temas de interesse relacionados à Agenda
2030. (Grifos nossos).

O alinhamento das metas do Judiciário com os ODS e a Agenda 2030 representa um importan-
te momento para o Judiciário brasileiro. A criação dos LIODS, por intermédio da Portaria n.º
119/2019 (Brasil, 2019)9, a aprovação da Meta 9 (“Integrar a Agenda 2030 ao Poder Judiciário”) e
a criação de uma Comissão Permanente de Acompanhamento dos ODS da Agenda 2030 denotam
que, para além do pacto de intenções, ações estão sendo orientadas e resultados podem ser men-
surados quanto ao alcance, difusão e controle da prestação jurisdicional.

A mobilização do órgão de cúpula do Judiciário em torno da concretização dos 17 objetivos sus-
tentáveis pressupõe a subscrição de pactos, protocolos, parcerias e intervenções alinhadas com
esses indicadores do desenvolvimento humano como caminho que visa à melhoria da prestação jurisdicional e à consecução de políticas afirmativas alinhadas com os direitos humanos consoli-
dados pela Agenda. As ações acompanhadas pelo PNUD buscam, assim, conceber estratégias para áreas desafiadoras, como a política criminal e a prestação jurisdicional socioeducativa, dentre
7 A parametrização da autuação processual refina o referenciamento estatístico para a concepção de projetos, planos e pro-

gramas governamentais.
8 A indexação temática aos ODS permite a observância do grau de adesão à Agenda pelo Judiciário Brasileiro.
9 Portaria depois revogada pela Resolução n.º 395/2021 (Brasil, 2021).

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A incorporação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável

outras. Nesse sentido, está prevista a implantação de escritórios sociais, centrais de vaga para a
socioeducação, núcleos de atendimento integrado, como também ações formativas continuadas
dirigidas à sensibilização dos operadores do direito quanto à importância de vincular a entrega
judicial aos objetivos de “crescimento econômico, desenvolvimento social e proteção ambiental”,
que fundamentam a concepção onusiana de desenvolvimento sustentável.

Reconhecendo os notáveis esforços acima descritos, que vêm sendo empreendidos pelos diversos ní-
veis do Poder Judiciário nacional e têm mobilizado distintos atores da sociedade brasileira em prol da concretização dos ODS, chamamos atenção neste trabalho para uma pertinente e necessária reflexão
acerca das implicações (ainda que tácitas) da assimilação dessa pauta universalista sem uma profunda
ponderação crítica acerca das concepções hegemônicas de direitos humanos e desenvolvimento e sem que se tomem as necessidades e especificidades da realidade brasileira como ponto de partida. Para
enfrentar esse debate, no próximo tópico, problematizaremos, a partir de uma perspectiva atenta ao
chamado “giro decolonial” (Maldonado-Torres, 2008; Ballestrin, 2013; entre outros), algumas ques-
tões referentes à cosmovisão desenvolvida a partir da modernidade/colonialidade capitalista, que deu
origem, entre outras coisas, aos conceitos de direitos humanos e desenvolvimento que se projetam
como “universais” por meio das instituições internacionais do pós-guerra.

2. Direitos humanos, universalismo e colonialidade

Segundo Aníbal Quijano (1992), Enrique Dussel (1993), entre muitos outros pensadores e pen-
sadoras contemporâneos10, a invasão do território que conhecemos hoje como América pelos eu-
ropeus, em 1492 é o ato constitutivo da modernidade e do moderno sistema-mundial capitalista
(Wallerstein, 2012). Ou seja, modernidade e colonialidade podem ser consideradas como “dois
lados de uma mesma moeda” (Mignolo, 2010, p. 46). O contato dos europeus com um outro que foi
percebido e projetado como inferior, sub-humano, passível de apropriação, exploração e aniquila-ção, modificaria também o olhar do europeu sobre si mesmo.
Se até 1492 a Europa era (e via a si própria como) parte de um mundo composto por diferentes
povos e impérios (Mignolo, 2013), mutuamente reconhecidos como contemporâneos no tempo
e reciprocamente considerados como humanos (apesar das diferenças culturais e religiosas), a
experiência de encobrimento do outro colonial (Dussel, 1993) proporcionou diversos processos simultâneos e interconectados, que modificariam para sempre o curso da história da humanidade:
a construção de um sistema-mundo capitalista (Wallerstein, 2012), dividido em zonas centrais,
semiperiféricas e periféricas; a criação e a consolidação da ideia de raça e, consequentemente, de uma hierarquia racial – com os europeus, “brancos”, no topo – que se expandiria para todo o plane-
ta através de um padrão mundial de poder, que Aníbal Quijano (1992) chamou de “colonialidade
do poder”; e a invenção da chamada “modernidade europeia”.

Nesse sentido, convém assinalar que o conceito de “colonialidade do poder” não se confunde com
o de colonialismo. Segundo Nelson Maldonado-Torres (2007, p. 31, tradução nossa), “colonialismo
denota uma relação política e econômica, na qual a soberania de um povo reside no poder de outro
povo ou nação, o que constitui a tal nação em um império”. Ou seja, o colonialismo se inicia com a

10 Podemos mencionar: Ramón Grosfoguel, Catherine Walsh, Walter Mignolo, Fernando Coronil, Nelson Maldonado-Torres,
Santiago Castro-Gómez, Zulma Palermo, Edgardo Lander, María Lugones, Arturo Escobar, entre outras e outros.

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conquista ibérica do território que hoje conhecemos como América e se encerra oficialmente com
a independência formal das últimas colônias, na metade do século XX.

Por outro lado, a colonialidade é um padrão de poder em escala mundial e de longa duração que per-
petua, de diferentes maneiras, as relações políticas e econômicas do colonialismo histórico, porém
sem a necessidade de preservar o regime de colônias. A colonialidade se instaurou tanto nas estrutu-
ras que regulam as relações (políticas, econômicas, comerciais, militares, etc.) internacionais quanto nas subjetividades das populações de todo o planeta, com a persistência das classificações raciais,
sociais e de gênero impostas pelo colonialismo e com o privilégio epistêmico que supõe, naturaliza e justifica a “universalidade” dos homens brancos europeus e de suas formas de ver, sentir e interpre-
tar o mundo (incluindo as suas particulares concepções de democracia e direitos humanos) também
desde o ponto de vista subjetivo-ontológico. Segundo Ramón Grosfoguel (2008, p. 126):

A colonialidade permite-nos compreender a continuidade das formas coloniais de domi-nação após o fim das administrações coloniais, produzidas pelas culturas coloniais e pelas
estruturas do sistema-mundo capitalista moderno/colonial. A expressão “colonialidade do
poder” designa um processo fundamental de estruturação do sistema-mundo moderno/
colonial, que articula os lugares periféricos da divisão internacional do trabalho com a hie-
rarquia étnico-racial global e com a inscrição de migrantes do Terceiro Mundo na hierar-
quia étnico-racial das cidades metropolitanas globais. Os Estados-nação periféricos e os
povos não-europeus vivem hoje sob o regime da “colonialidade global” imposto pelos Esta-
dos Unidos, através do Fundo Monetário Internacional (FMI), do Banco Mundial (BM), do
Pentágono e da OTAN. As zonas periféricas mantêm-se numa situação colonial, ainda que já
não estejam sujeitas a uma administração colonial.

Ou seja, o colonialismo histórico deu lugar a um múltiplo e duradouro processo de colonização de
diversos aspectos da vida, cujas características principais persistem até a atualidade, sob diferen-
tes formas: colonizou as espacialidades pela lógica da dominação, da conquista, da apropriação e
mercantilização dos territórios e do saqueio dos recursos naturais; colonizou as temporalidades por meio a criação de uma narrativa histórica linear e unidimensional – a invenção da moderni-dade (Mignolo, 2013) –, com a Europa sempre na vanguarda do “progresso” histórico da huma-nidade, de modo que os outros povos são classificados como atrasados e primitivos; colonizou as
corporalidades por meio da imposição do patriarcado, da hétero/cisnormatividade e do racismo,
que se projetam também na divisão do trabalho e do acesso aos recursos necessários para a pro-
dução e reprodução da vida; e colonizou as subjetividades mediante a projeção, como “universal”,
de uma forma particular de entender as relações humanas, sociais e dos seres humanos com a
natureza, logrando gradualmente consolidá-la no imaginário das populações tanto nos centros
quanto nas periferias do sistema-mundo. O eixo que articulou todos esses aspectos foi a expansão,
por meio da violência colonial, do regime burguês de propriedade privada, com suas normas, ins-
tituições e relações sociais derivadas. Conforme argumenta Edgardo Lander:

Esta cosmovisão tem como eixo articulador central a ideia de modernidade, noção que
captura de forma complexa quatro dimensões básicas: 1) a visão universal da história as-sociada à ideia de progresso (a partir da qual se constrói a classificação e hierarquização
de todos os povos e continentes, e experiências históricas); 2) a “naturalização” tanto das
relações sociais como da “natureza humana” da sociedade liberal-capitalista; 3) a naturali-
zação ou ontologização das múltiplas separações próprias dessa sociedade; e 4) a necessá-
ria superioridade dos saberes que produz essa sociedade (‘ciência’) sobre todo outro saber.
(Lander, 2000, p. 9, tradução nossa).

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Santiago Castro-Gómez (2005) chamou a pretensão de universalidade construída pela racionali-
dade moderna/colonial de “hybris do ponto zero”. Essa hybris (expressão que, em grego, significa
arrogância, prepotência, desmesura) consiste na crença na possibilidade de construção de uma perspectiva privilegiada de observação da realidade que, ao ocultar o lugar – tanto geográfico quanto epistemológico – do sujeito que produz conhecimento, projeta a ilusão de um locus de
observação ideal, abstrato, fora do tempo e do espaço, que pode observar sem ser observado. Esse artifício alçou a visão de mundo dos colonizadores ao status de ponto zero de observação e de
produção de conhecimentos universalmente válidos.

Permitiu ao “homem” ocidental representar seu conhecimento como o único capaz de atin-
gir consciência universal e descartar o conhecimento não ocidental taxando-o de particu-
larista e incapaz de alcançar a “universalidade”. Foi a estratégia crucial para os desenhos
globais ocidentais. Ao ocultar o lugar do sujeito de enunciação, a expansão e a dominação
coloniais europeias/euro-americanas puderam construir uma hierarquia de conhecimento
superior e inferior e, portanto, de gente superior e inferior em todo o mundo. Passamos
da caracterização de «gente sem escrita» do século XVI à caracterização de «gente sem
história» nos séculos XVIII e XIX, à de «gente sem desenvolvimento» no século XX e, mais
recentemente, no começo do século XXI, à de «gente sem democracia». Passamos dos «di-
reitos dos povos» no século XVI (o debate de Sepúlveda contra Las Casas na escola de Sa-lamanca em meados daquele século), aos «direitos do homem» no século XVIII (filósofos
do Iluminismo), e aos «direitos humanos» do século XX. Todos eles são parte de desenhos
globais articulados à produção e à reprodução simultânea de uma divisão internacional do
trabalho centro/periferia que coincide com a hierarquia racial/étnica global dos europeus
e não europeus. (Grosfoguel, 2006, p. 23, tradução nossa).Ao longo dos últimos cinco séculos, os argumentos utilizados para justificar a “superioridade” euro-

peia/anglo-americana diante dos outros povos do mundo foram diversos. Inicialmente, as teorias do
mandato divino e as bulas papais do século XVI reconheciam um direito sagrado dos colonizadores
sobre as terras invadidas, ao colocar em questão a humanidade dos povos indígenas. Já na “segunda
modernidade” (Dussel, 1993), o Iluminismo europeu secularizou a ideia de “superioridade” euro-
peia (Vitória, 2015), deslocando gradualmente a autoridade de produção de conhecimento da teolo-gia à filosofia e às ciências naturais a partir da “hybris do ponto zero” (Castro-Gómez, 2005). Pensa-
dores como John Locke (1632-1704), Charles de Montesquieu (1689-1755), François-Marie Arouet
“Voltaire” (1694-1778), David Hume (1711-1776), Immanuel Kant (1724-1804), Georg Wilhelm
Friedrich Hegel (1770-1831), entre outros, defenderam abertamente a inferioridade das “raças” não
europeias (ver, por exemplo, Losurdo, 2006; Grosfoguel, 2008; Vitória, 2015).

Com a abolição legal da escravidão e o início do processo de independência formal das colônias, a
partir de meados do século XIX, a modernidade/colonialidade desloca os conceitos de superioridade
e inferioridade, até então atribuídos a critérios biológicos, para o campo da cultura. Assim, em que pese o gradual reconhecimento filosófico pelo Ocidente de que todos os seres humanos são iguais
do ponto de vista biológico, as culturas seriam diferentes e possuiriam distintos níveis evolutivos
na caminhada unidirecional da humanidade em direção ao progresso, com a sociedade ocidental
encarnando o que há de mais elevado, a fase mais complexa da civilização humana. Nesse contexto,
a igualdade formal passou a ocultar o racismo ocidental por meio dos conceitos de meritocracia e
progresso (que mais tarde, na metade do século XX, darão lugar ao conceito de “desenvolvimento”,
conforme veremos mais adiante). Conforme sintetiza Edgardo Lander (2000, p. 7, tradução nossa):
“Foi, assim, necessário estabelecer uma ordem de direitos universais de todos os seres humanos
como passo precisamente para negar o direito à maioria deles”.

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É nessa última etapa da modernidade/colonialidade, que coincide temporalmente com a primeira
Revolução Industrial e com as Revoluções Burguesas, que o conceito de direitos humanos passa
a ser impulsado enquanto “desenho global” (Pérez Almeida, 2011, p. 120) do Ocidente. Um
conceito que, paradoxalmente, combina promessas abstratas de liberdade, igualdade e justiça
social, capazes de mobilizar os imaginários de indivíduos e grupos subalternizados pelas distintas
hierarquizações impostas pelo sistema-mundo capitalista moderno/colonial, racista e patriarcal
com a assimilação/naturalização das principais causas que produzem e reproduzem essas mesmas
assimetrias estruturais, que dividem o mundo em “vencedores” e “vencidos”. Assim, o discurso dos
direitos humanos termina colonizando as utopias (Vitória, 2017) e delimitando o campo das pos-
sibilidades de transformação social, restringindo-o às alternativas compatíveis com a manutenção
das lógicas capitalistas e com a estruturalmente assimétrica divisão internacional do trabalho, que – ao fim e ao cabo – perpetuam dinâmicas coloniais.

Ao construir-se a noção de universalidade a partir da experiência particular (ou paroquial)
da história europeia e realizar a leitura da totalidade do tempo e do espaço da experiência
humana a partir dessa particularidade, se erige uma universalidade radicalmente exclu-
dente. (Lander, 2000, p. 6, tradução nossa).

Conforme argumenta Raimon Panikkar (2004), essa concepção particular e excludente de direitos
humanos, que se projeta como universal por meio de instituições como a ONU, fundamenta-se no
pressuposto de que existe uma “natureza humana universal, comum a todos os povos” (Panikkar,
2004, p. 212), que deve ser cognoscível por todos os seres humanos por meio de um instrumento
também universal chamado razão. Essa natureza humana deve ser especialmente diferente do
restante da realidade, de modo que os outros seres não humanos são tidos não apenas como dife-
rentes, mas também como inferiores (Panikkar, 2004, p. 213). Ainda segundo o autor, a concepção
ocidental de direitos humanos se baseia na separação/oposição entre indivíduo e sociedade, e a
“autonomia da humanidade frente ao cosmos, e muitas vezes em oposição a ele” (Panikkar, 2004,
p. 214). Ademais, é pressuposta também a existência de uma “ordem social democrática”, enten-
dida, desde a perspectiva do individualismo metodológico, como a “soma de indivíduos ‘livres’”, o que pressupõe também uma concepção abstrata das liberdades individuais, entre as quais figura
como absoluta a concepção burguesa de propriedade privada.

Seguindo esse raciocínio, se assumirmos que os direitos humanos e a natureza humana universal
que fundamentam a concepção onusiana são, de fato, universais e cognoscíveis a todos os seres
humanos igualmente por meio da razão, inevitavelmente estamos aceitando que a cultura ociden-
tal, por haver compreendido essa “verdade universal” antes de todas as outras, seria mais avan-
çada ou superior. Ademais, estaríamos assumindo uma cultura particular como encarnação do
universal, de maneira que, tautologicamente, torna-se impossível criticar o Ocidente com relação
aos direitos humanos ou à democracia, dado que seria ele próprio o “grau zero” desses conceitos.
Por isso, para Panikkar, a resposta acerca da universalidade dos direitos humanos realmente exis-
tentes é “um sonoro não” (Panikkar, 2004, p. 216). É preciso, portanto, incluir outras vozes, outros
saberes e outras cosmovisões. Em que pesem todos esses aspectos, que não podem ser ignorados – uma vez que limitam imen-
samente o horizonte de possibilidades de transformação social em favor das maiorias exploradas pelas múltiplas hierarquias do sistema-mundo capitalista, racista e patriarcal –, entendemos que os direitos humanos realmente existentes podem – e devem – ser reivindicados criticamente para
enfrentar determinadas situações de violação e vulnerabilidade, sempre que for possível, em qual-

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A incorporação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável

quer das suas três vertentes (Cançado Trindade, 2003). Ou seja, ainda que se reconheça o caráter
colonial, despolitizado, monocultural e abstrato dos direitos humanos realmente existentes e sua
paradoxal compatibilidade com diversas lógicas de dominação estruturais inerentes ao capitalis-
mo histórico (Wallerstein, 2012), reconhecemos que constituem ferramentas importantes (mes-
mo que não ideais), que estão à disposição e devem ser usadas sempre que possibilitem avanços
concretos em favor do ser humano, individual ou coletivamente.

Entretanto, diante desses limites objetivos, somos levados a constatar a evidente necessidade
de se repensar (Sánchez Rubio, 2007), reinventar (Herrera Flores, 2009) e decolonizar (Vitória,
2017) os direitos humanos, a partir de perspectivas teóricas e práticas mais plurais e diversas,
que sejam capazes de romper as hierarquias raciais, sexuais, econômicas, militares, etárias, de
gênero e epistêmicas da colonialidade e que possibilitem a construção de um mundo em que cai-
bam muitos mundos (Vitória, 2015). Trata-se de um projeto coletivo, que vem sendo reivindicado
em diferentes partes do mundo, por distintas cosmovisões e com uma pluralidade de caminhos
possíveis a serem trilhados.

3. (Sub)desenvolvimento (in)sustentável e capitalismo periférico

Como argumentamos, a ideia de progresso foi uma das principais ferramentas da imposição da
“universalidade” da cosmovisão ocidental a partir do processo de colonização do mundo iniciado
em 1492. A narrativa de evolução histórica linear e unidirecional, ao mesmo tempo em que jus-tifica as diferenças entre as nações “avançadas” e as “primitivas” (ocultando o saqueio colonial e
imperial), também impõe, de forma tautológica, o individualismo metodológico e o modelo capita-
lista de acumulação como os únicos caminhos a serem seguidos pelas nações empobrecidas para
atingir os mesmos padrões das nações enriquecidas.

Apesar da origem colonial da ideia de progresso histórico linear, é importante destacar que os con-
ceitos de “desenvolvimento” e “subdesenvolvimento”, tal como os conhecemos hoje, surgem apenas
no contexto do pós-Segunda Guerra Mundial, período em que a Declaração Universal de 1948 e o
sistema das Nações Unidas estabeleceram a igualdade formal entre indivíduos e entre estados sobe-
ranos como pilares do novo direito internacional. Naquele momento, havia a necessidade de recons-
trução da Europa e o plano Marshall, lançado pelos Estados Unidos em 5 de junho de 1947, tinha também a finalidade de dar vazão ao enorme potencial produtivo estadunidense e assegurar-lhes a
condição de principal potência hegemônica mundial. Iniciava-se a Guerra Fria, que desencadeou na
criação da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) em 1949 e do Pacto de Varsóvia em
1955, com o propósito de agregar os dois polos de poder que tencionavam entre si.

Em meio a todo esse contexto, o então presidente estadunidense Harry Truman, em seu “Discurso sobre o Estado da União” de 1949, qualificou os países centrais11, que enriqueceram com o saqueio

11 Conforme explicam Paulo Renato Vitória e Gabriela Maia Rebouças (2019, p. 429): “É importante ressaltar que os Estados
Unidos foram concebidos como “centro” e não como “periferia” no sistema-mundo moderno/colonial desde sua coloniza-ção. Sua expansão econômica e territorial – consequência do desenvolvimento da primeira experiência humana assentada em instituições, práticas e valores originalmente capitalistas, justificados ideologicamente pelo ascetismo puritano dos colonos britânicos em sua busca pela construção de uma “cidade sobre a colina” e pela filosofia política de Locke, e favore-cidos pela abundância de recursos naturais e terras, em comparação com a Europa – os permitirá entrar no século XIX, já
como um Estado independente, em condições de disputar com as metrópoles europeias o controle das demais colônias do
continente, fortalecendo a consolidação do mito do “excepcionalismo estadunidense””.

10

Paulo Renato Vitória; Iracy Ribeiro Mangueira Marques

das colônias, como regiões “desenvolvidas” e os países periféricos, vítimas de mais de quatro sé-
culos de espoliação colonial, de “subdesenvolvidos”. Segundo Truman, que pode ser recordado
também por ter sido o único ser humano a lançar bombas atômicas contra outros seres humanos,
os Estados Unidos, enquanto país “desenvolvido”, estariam dispostos a colocar os seus avanços científicos e progressos industriais à disposição das regiões “insuficientemente desenvolvidas”,
para garantir o seu aprimoramento e seu crescimento econômico. Segundo Truman (1949, n.p.):
“nosso objetivo deve ser ajudar os povos livres do mundo inteiro a que, mediante seus próprios
esforços, produzam mais alimentos, mais vestimentas, mais materiais para a construção e mais
energia mecânica para aliviar suas pesadas cargas”.

Desse modo, a pobreza do “subdesenvolvimento” e a riqueza do “desenvolvimento” deixam de ser entendidas como processos relacionais e interdependentes para figurar discursivamente como
diferentes etapas de uma continuidade linear. Ou seja, seguindo esse raciocínio, “o estado do ‘sub-
desenvolvimento’ não é o inverso do ‘desenvolvimento’, mas sua forma ainda inacabada ou, para
seguir a metáfora biológica, ‘embrionária’; nestas condições, uma aceleração do crescimento apa-
rece como único método para reduzir a diferença” (Rist, 2002, p. 89).

O discurso do “desenvolvimento” convida as novas nações independentes a integrar-se na econo-
mia-mundo capitalista seguindo as políticas de liberalização propostas por Washington e pelos or-ganismos internacionais sob a sua influência, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco
Mundial (BM), a própria ONU e, mais tardiamente, a Organização Mundial do Comércio (OMC). Além de justificar a necessidade de intervenção externa (por meio de “ajuda para o desenvolvimento”, in-vestimento estrangeiro direto e de ajustes econômicos de caráter liberal, financeiro e globalizador),
essa integração dos países periféricos ao “desenvolvimento” serve também para assegurar a hege-
monia estadunidense no campo ideológico, pela assimilação de seu modelo de produção e consumo
desenfreados como “promessas” de um futuro farto e abundante, em contraposição com a austeri-
dade do modelo existente no campo socialista. Conforme explica Gilbert Rist:

Até então as relações Norte/Sul estavam fundamentalmente organizadas de acordo com a
oposição colonizadores/colonizados. A nova dicotomia “desenvolvidos/subdesenvolvidos”
propõe uma relação diferente conforme a nova Declaração Universal dos Direitos Humanos
e a progressiva mundialização do sistema estatal. A antiga relação hierárquica das colô-
nias submetidas à sua metrópole é substituída por um mundo em que todos (os estados)
são iguais diante do direito, ainda que não o sejam de fato. O colonizado e o colonizador
pertencem a dois universos não apenas distintos, mas também opostos e, para reduzir a diferença, o enfrentamento – a luta de liberação nacional – parece inevitável. Enquanto
o “subdesenvolvido” e o desenvolvido são da mesma família; inclusive se o primeiro tem
algum atraso com relação ao segundo, pode esperar que se elimine essa diferença, ao modo
do “sub”-chefe que pode sonhar um dia em ser chefe... a condição de jogar o mesmo jogo é não possuir uma visão muito diferente da chefia. (Rist, 2002, p. 88-89, tradução nossa).

De fato, é muito mais aceitável, do ponto de vista discursivo, ser denominado como um “país em
vias de desenvolvimento” do que como uma (neo)colônia ou uma periferia do sistema-mundo.
Ocorre que, paradoxalmente, quanto mais os países “subdesenvolvidos” seguem os caminhos do
desenvolvimento capitalista, mais “subdesenvolvidos” e dependentes (de potências centrais, gran-
des corporações transnacionais e organismos internacionais) se tornam. Essa constatação, feita
por diversos intelectuais latino-americanos na década de 1970 (Marini, 2000; Bambirra, 2013;
entre outros) a partir de uma análise focada nas interrelações econômicas, sociais e políticas, co-
locou em xeque a receita de desenvolvimento exportada pelo Ocidente capitalista.

11

A incorporação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável

Os teóricos da dependência estrutural, seguindo uma orientação marxista, defenderam que “as ra-
ízes do subdesenvolvimento se encontravam na conexão entre a dependência econômica externa
e a exploração social interna (especialmente de classe) e não em uma suposta carência de capital,
tecnologia ou de valores modernos” (Escobar, 2014, p. 27, tradução nossa). Ainda conforme Ar-
turo Escobar (2014, p. 27-28, tradução nossa), “para os teóricos da dependência, o problema não
residia tanto no desenvolvimento, mas no capitalismo; quer dizer, o desenvolvimento e a moder-
nização se lograriam com a transformação das sociedades de capitalistas em socialistas”.

Entretanto, a partir da década de 1980, o próprio conceito de desenvolvimento passou a ser de-
sacreditado, tanto pelo seu fracasso empírico em transformar países “subdesenvolvidos” em “de-
senvolvidos”12 quanto pela emergência da crise ambiental, que é multidimensional e está cada vez
mais bem documentada por cientistas de distintas áreas do conhecimento (Taibo, 2020), o que
torna absolutamente insustentável a busca pelo crescimento econômico enquanto critério “uni-
versalizável”. Diante disso, diferentes conceitos foram colocados em marcha pelo pensamento he-gemônico, com a finalidade de compatibilizar o sistema de acumulação de capital com a proteção do meio ambiente, confiando a solução dos problemas causados pelas forças do chamado “livre
mercado” ao próprio “livre mercado”. Serge Latouche (2009) elabora uma cuidadosa genealogia
de conceitos, como desenvolvimento “em partícula”, desenvolvimento social, desenvolvimento hu-
mano, desenvolvimento local, desenvolvimento sustentável e desenvolvimento alternativo, para
chegar à conclusão de que se trata de adjetivos criados pelo próprio imperialismo ocidental para justificar a si próprio. Segundo ele:

Desenvolvimento é um conceito armadilha. Consegue admiravelmente o trabalho de ilu-
são ideológica que se denuncia em “Os cães de guarda” (Nizan) ou os “branqueadores do
império” (Brecht), no sentido de criar um consenso entre partes antagônicas graças a um
escurecimento do juízo e à uma anestesia do sentido crítico de suas vítimas, quando as
expressões de acumulação de capital, de exploração da força de trabalho, de imperialismo
ocidental ou de domínio planetário, que são a verdade do desenvolvimento e da globali-zação, teriam que provocar, justificadamente, uma reação de rechaço por parte daqueles
que estão do lado fraco da luta de classes e da guerra econômica mundial. A obra-prima nesta arte da mitificação é, sem dúvida, o “desenvolvimento sustentável”. Precisamente por
essa razão, o desenvolvimento é um conceito perverso. (Latouche, 2009, p. 22-23, tradução
nossa).

Conforme argumenta Alfredo Olmeda (2017, p. 90, tradução nossa), “se trata de reconceitualizar o
desenvolvimento para convertê-lo no que nunca foi: humano, sustentável, integral, etc.”. Propostas
como o “desenvolvimento sustentável” são, portanto, propostas que tentam absorver as críticas
a uma determinada parte do problema para absolver o todo, na medida em que não questionam
a premissa/dogma do crescimento econômico, as relações de exploração capitalista, as relações
internacionais assimétricas e a divisão internacional do trabalho racializada. Impulsados pelos
governos centrais e grandes corporações transnacionais, esses conceitos visam “compatibilizar”
teoricamente seus interesses econômicos predatórios, o modo de vida consumista dos países de-
senvolvidos e a exploração das periferias (trabalho e recursos naturais) com a proteção da nature-
za e o combate às desigualdades.

12 Salvo raríssimas exceções, cujas condições históricas e particularidades ou não são replicáveis ou não são desejáveis (Oso-
rio, 2015).

12

Paulo Renato Vitória; Iracy Ribeiro Mangueira Marques

Por isso, se questionam as modas do mundo da cooperação que geraram todo tipo de pro-
dutos: desenvolvimentos egoístas, endógenos, participativos, comunitários, integrados,
autênticos, autônomos e populares. Considere também os modelos de desenvolvimento
local, microdesenvolvimento, endodesenvolvimento e, por suposto, o mais que cínico etno-desenvolvimento. Cabe assinalar que toda esta série de adjetivos (o prefixo que quer cum-
prir a mesma missão), na realidade, nunca questionou as raízes sobre as que se constroem
as relações de dominação, a partir de sua própria acumulação capitalista que é a base do
desenvolvimento (Olmeda, 2017, p. 90-91).

Entretanto, conforme aponta Arturo Escobar (2014), existem atualmente pelo menos cinco ten-
dências nos estudos críticos do desenvolvimento, que são capazes de questionar não apenas a
degradação do meio ambiente e a inferiorização de uma grande parcela da população mundial por outra, mas também as suas causas mais profundas – arraigadas na cosmovisão liberal e individu-
alista que o Ocidente exportou ao resto do planeta através do colonialismo, do imperialismo e da
globalização. São respostas desde o Sul global, que rompem com as distintas hierarquizações e classificações que o pensamento hegemônico impôs como universais. São elas:

[1] um arcabouço teórico consistente e forte: a chamada perspectiva da modernidade, co-
lonialidade e decolonialidade (MCD), especialmente sua ênfase na descolonização epistê-
mica; [2] um imaginário teórico-político: alternativas ao “desenvolvimento” acompanhado
da conceituação do Bem Viver (BV) como expressão mais clara do imaginário emergente;
[3] uma proposta teórico-prática de transformação econômica e social: as transições para
o pós-extrativismo; [4] um discurso aparentemente antigo, mas em processo de renovação e concretização: a crise do modelo civilizatório; [5] e, por fim, uma posição teórica mas com
grande ressonância na prática política dos movimentos, articulada em torno da relaciona-
lidade e do “comunal”, incluindo as perspectivas do “pluriverso”. (Escobar, 2014, p. 37-38,
tradução nossa).

Não iremos aprofundar individualmente esses cinco aspectos aqui neste trabalho, porque fugiria
ao nosso escopo. Entretanto, assumiremos, com Arturo Escobar e muitos outros pensadores e
pensadoras comprometidos com a busca por um mundo livre de todas as lógicas de dominação, exploração e inferiorização humana, que é possível modificar a realidade que vivemos a partir das
experiências coletivas dos povos que resistem e que por meio de suas lutas, saberes e práticas
constroem “outros mundos possíveis” neste mundo aparentemente sem alternativas. Apostamos,
neste trabalho, por uma combinação de algumas dessas propostas, sobretudo o pensamento de-
colonial, a crítica do modelo civilizatório ocidental e os estudos do pluriverso, para pensarmos em
outro(s) modelo(s), coerente(s) com as necessidades concretas inerentes à nossa realidade.Conforme afirma Santiago Castro-Gómez (2012, p. 221, tradução nossa), “o papel da crítica não
pode ser outro que o de «problematizar», assinalar os limites”. Nesse sentido, após havermos ex-
plorado diversos limites das concepções de direitos humanos e desenvolvimento plasmadas nas
principais instituições internacionais, pretensamente universais, retomaremos no próximo tópico
a discussão sobre algumas possibilidades de utilização/apropriação dessa pauta de forma crítica
e decolonial, no âmbito do Poder Judiciário brasileiro, que possa contribuir para subverter, ainda
que de forma progressiva e pontual, as diferentes lógicas de exclusão que perpetuam as distintas
hierarquias da colonialidade.

13

A incorporação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável

4. Da agenda universal à sua incorporação pluriversal

Reconhecer o caráter particular e o DNA colonial dos direitos humanos realmente existentes e do conceito de “desenvolvimento” (e suas variantes) não significa, em absoluto, renunciar à ideia
de pensar direitos humanos a partir de outras perspectivas mais plurais e diversas nem mesmo
abdicar da sua utilização crítica diante de violações e vulnerabilidades concretas. Pensar os di-reitos humanos para além (e contra) (d)as lógicas da colonialidade é um desafio complexo, que
requer um pensamento e uma práxis que transcendam as estruturas argumentativas próprias da
modernidade e questionem os lugares de privilégio naturalizados pelas narrativas e lógicas hege-
mônicas.

Entendemos que esse caminho passa pela desconstrução da ideia de universalidade (que privile-
gia apenas um ponto de vista) e pela aposta na construção de espaços transmodernos13 pluriver-
sais14, em que as epistemologias, os saberes e as experiências práticas dos povos originários e das
periferias subalternizadas e racializadas pelo Ocidente possam contribuir com esse desenho de
mundo que se pretende menos desigual, mais inclusivo e sustentável, em que sejam lançadas as
bases para a erradicação da pobreza e da fome; em que se produza uma agricultura sustentável;
em que se possa dispor de saúde, bem-estar, educação de qualidade, água potável, energia limpa,
trabalho e partilha econômica; um mundo em que o clima, a água, os mares e os espaços terrestres sejam objeto de preservação constante; em que se possa gestar paz, justiça e instituições eficazes,
mediante o enfrentamento das desigualdades estruturais e implementação de condições materiais
capazes de transformar a retórica do discurso em uma possibilidade de existência satisfatória.

E, nesse sentido, considerando os limites já delineados mais acima, refletimos sobre as possibili-dades de ação desde um lugar social e epistêmico e uma conjuntura específica: o Poder Judiciário
brasileiro, no contexto da implementação dos ODS da ONU. Em outros termos: como partir de
outras cosmovisões mais plurais e diversas, menos focadas no crescimento econômico e mais vol-
tadas à preservação ambiental e à distribuição democrática do acesso aos bens materiais e imate-
riais que todas e todos necessitamos para viver? Como pensar num “desenvolvimento sustentável”
(assumindo os riscos de usar essa expressão tão controversa) em alinho com a satisfação das reais
necessidades do ser humano e não como resposta às projeções pautadas pelo grande capital e pela
lógica da colonialidade imbricada no âmago das sociedades periféricas? Como prestar jurisdição
de modo inclusivo e estratégico, a partir de uma perspectiva a considerar as pautas identitárias
e a posicionalidade dos múltiplos sujeitos? Como conceber um Judiciário de tode(o/a)s, com to-
de(o/a)s e para tode(o/a)s?

13 Segundo Nelson Maldonado-Torres (2007, p. 162-163, tradução nossa): “O reconhecimento da diversidade epistêmica leva
a conceber os conceitos de descolonização como convites ao diálogo, e não como imposições de uma classe esclarecida.
Tais conceitos são expressões da disponibilidade dos sujeitos que os produzem ou os utilizam para dialogar e produzir
mudanças. A descolonização, dessa forma, aspira a romper com a lógica monológica da modernidade. Pretende, portanto,
promover a transmodernidade: um conceito que também deve ser entendido como um convite ao diálogo e não como um
novo universal abstrato imperial. A transmodernidade é um convite a pensar a modernidade/colonialidade criticamente, a
partir de posições e de acordo com as múltiplas experiências de sujeitos que sofrem de diferentes formas com a coloniali-
dade do poder, do saber e do ser”.

14 Explica Ramón Grosfoguel (2008, p. 212, tradução nossa) que: “Esses espaços exteriores não são puros nem absolutos. Eles
foram produzidos e afetados pela modernidade/colonialidade do sistema-mundo. É desde a geopolítica e corpo-política do
conhecimento dessa exterioridade ou marginalidade relativa que o pensamento crítico de fronteira surge como uma crítica
da modernidade em direção a um mundo descolonizado transmoderno pluriversal de múltiplos e diversas projetos ético-
-políticos, em que uma real comunicação e um diálogo horizontal com igualdade podem existir entre os povos do mundo,
para além das lógicas e práticas de dominação e exploração do sistema-mundo”.

14

Paulo Renato Vitória; Iracy Ribeiro Mangueira Marques

Democratizar o Poder Judiciário, dotá-lo de efetividade, é sobretudo trazer ao cenário discursivo a
sua legitimidade, é compreender o exercício do poder de prestar jurisdição a partir da necessária
transversalidade, para além de um processo contraditório e dialético. É transcender a meritocra-
cia para acessar critérios mais representativos e paritários, a exigir a inserção da diversidade em
seu núcleo de governança. É fecundar o universal com o pluriversal e sobretudo questionar: quem
fala a partir do Judiciário15? Qual a lógica que permeia a solução dos conflitos, sejam esses indivi-
duais, coletivos, sejam mesmo estruturais e estratégicos? A efetivação do ideal de paz e o acesso à justiça e a instituições eficazes não podem desconsiderar
as interseccionalidades presentes em cada território, a superação da precarização econômica e a
ruptura epistemológica com o caráter excludente da matriz civilizatória ocidental, caracterizada
por um viés cosmopolita colonizador. Exige, para além da desterritorialização do direito (Mar-
ramao, 2017), um constante dialogar com a realidade nacional, buscando situar o Judiciário no
contexto social, político e cultural de um determinado momento histórico, em uma perspectiva de
pluralidade de caráter não excludente e capaz de enfrentar as contradições gestadas pelo grande
capital e a desordem que provoca a acumulação irracional de riquezas por poucos em detrimento
de uma política de satisfação e bem-estar social para todos.

A adesão do Poder Judiciário à Agenda 2030 pode ser tomada como uma oportunidade de apri-
moramento da prestação jurisdicional a partir de uma perspectiva crítica e pluriversal, por meio
de ações concretas que visem construir respostas coletivas, a partir da escuta ativa e da aproxima-
ção com as demandas das populações, a perseguir um horizonte ético, político e epistemológico
verdadeiramente sustentável, democrático e inclusivo. É necessário fecundar e reconstruir essa
agenda, a partir de uma cultura de aprofundamento crítico do modelo operativo das governanças
judiciárias nacional e locais, das instâncias de poder formal e informal, buscando conferir aos pro-cessos uma qualidade de entrega a superar a solução do conflito no plano individual para alcançar
a sua dimensão coletiva, traduzindo-se, assim, em novas realidades e alternativas concretas aos
problemas suscitados.

Uma integração multipolar real, e não meramente formal, que se traduza em efetiva resistência in-
tercultural, mediante a integração das pautas nacionais a essa pauta supranacional, em constante busca pela superação das classificações e hierarquizações sociais e pelo respeito às fronteiras do conhecimento humano e à confluência de suas zonas de intersecção. Nesse sentido, cabe realçar as
diretrizes que compõem o Plano de Ação Nacional para implementação da Agenda 2030 no Judici-
ário Brasileiro, quando essas fazem referência à necessidade de adequação da agenda à realidade
nacional, destacando-se:

(i) o lançamento do Plano de Ação da Comissão Nacional para os ODS; (ii) o mapeamento
da relação entre as políticas públicas vigentes nos Ministérios e o PPA 2016-2019 com as metas dos ODS para verificação de suficiência e possíveis lacunas;(iii) a adequação das metas globais à realidade nacional; (iv) a definição dos indicadores nacionais dos ODS; (v)
o desenvolvimento de ferramentas/plataforma para disseminação dos ODS; e (vi) proces-

15 Nosso objetivo central aqui é conjecturar possíveis caminhos para uma aplicação crítica da pauta universalista onusiana
pelo Poder Judiciário brasileiro. Ainda que não aprofundemos neste trabalho, por motivos de delimitação, a questão das
desigualdades (raciais, de gênero, sexuais, de classe, etc.) que marcam a sua composição, o que, sem dúvida, é também re-flexo da generalização do padrão colonial de poder, entendemos que se trata de uma questão importantíssima, que merece
ser destacada. Sem dúvida, a decolonização do direito passa pela democratização do próprio Judiciário e da presença de
corpos, experiências e epistemologias mais representativos da realidade do nosso país. Nesse sentido, ver, por exemplo,
Oliveira (2016), Alves (2017), Lages e Assis (2018), entre outros.

15

A incorporação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável

sos e iniciativas de interiorização/localização da Agenda 2030 em todo território nacional
(Caldas apud Diz, 2019, p. 100).

No Judiciário Brasileiro, essa possibilidade pode se dar, a partir da incorporação à Agenda 2030
de práticas implementadas pelas experiências locais e regionais, por medidas que visem garantir
uma composição mais plural do próprio Judiciário, como também pela recepção em seu núcleo
de poder de uma maior representatividade da diversidade cultural, étnica, de classe e de gênero
que caracteriza a realidade nacional. Igualmente, é fundamental compor com a complexidade dos múltiplos sujeitos, cujos conflitos são dirimidos pelo Sistema de Justiça, a partir da disposição de
diversos métodos (inclusive os consensuais) de solução de litígios, pretendendo conferir à inter-venção judicial efetividade, eficácia e legitimação social.
Alguns apontamentos propositivos podem ser articulados com a ampla participação da repre-
sentatividade, inclusive dos segmentos envolvidos, a exemplo da criação de grupos de trabalho e
Laboratórios de Inovação, Inteligência e Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – LIODS, para
gestar e incorporar novas metodologias de enfrentamento da demanda judicial com o objetivo de aprimoramento das entregas complexas, notadamente daquelas que desafiam a articulação
de diversos saberes, equipamentos públicos e instâncias de poder; da oferta de ações formativas,
com o emprego de metodologias ativas, de modo a potencializar a empatia do julgador e serven-
tuários em relação às demandas e expectativas dos destinatários da prestação jurisdicional; e de
dotar a assistência judiciária de uma amplitude e capilaridade, além da necessária integração da
capacidade postulatória, conferindo, por meio de parcerias, amplo acesso das partes aos distintos saberes que por vezes são necessários à construção da resposta ao conflito (intervenções psicos-
sociais, acesso a exames médicos imprescindíveis à solução do litígio, perícias médicas e contá-beis, etc.); e de garantir ampla oferta de métodos consensuais para a solução do conflito, como a
mediação, a conciliação e as práticas restaurativas, dentre outros.

Ademais, se a adesão da Agenda 2030 nos remete a uma perspectiva universalizante, esperamos
que a execução de práticas operadas no âmbito dos LIODS16 e sistematizadas nos Bancos de Boas
Práticas possam conduzir uma interação dialética capaz de erigir o Judiciário Brasileiro ao pa-
pel de construtor de uma política judiciária referenciada por mínimos éticos supranacionais, mas
também respaldada por sua realidade criativa e pelo enfrentamento das contradições materiais
que invisibilizam formas de existência do ser humano. A Agenda 2030, ao reivindicar a promoção do ser humano, se afigura como possibilidade de reelaboração de iniciativas autorais dos núcleos
de governança do Estado brasileiro, a partir de uma parametrização fundada em uma hermenêu-
tica diatópica (Panikkar, 2004).

Em síntese, a integração da Política Judiciária à Agenda 2030, ao pavimentar as bases de um Es-
tado alinhado com os direitos humanos fundamentais, deve pautar-se nas intersecções existen-

16 “Art. 3º – Compete ao LIODS: I – Monitorar e promover a gestão judicial processual e administrativa dos dados da Agenda 2030; II – Elaborar e implementar plano de ação com soluções conjuntas e pacíficas voltadas à melhoria da gestão públi-ca, visando evitar judicialização excessiva, e outras agendas de interesse global; IV – Dialogar com a Rede de Governança Colaborativa do Poder Judiciário quando necessário para a difusão da Agenda; V – Mapear os programas e projetos desen-volvidos pelas redes de inovação dentro do Judiciário, ligados à pauta global da Agenda 2030; VI – Estabelecer conexões
entre os Laboratórios de Inovação e os Centros de Inteligência judiciários para o desenvolvimento de projetos conjuntos dentro da Agenda; VII – Incentivar pesquisas, artigos e estudos sobre os ODS no Poder Judiciário; VIII – Abrir espaço para a
participação cidadã na concepção de projetos inovadores no Poder Judiciário que contribuam para a efetividade da Agenda 2030; IX – Apoiar os órgãos do CNJ na busca de soluções para problemas complexos, tomando por base metodologias de
inovação e inteligência que considerem a empatia, colaboração interinstitucional e a experimentação.” (Brasil, 2019).

16

Paulo Renato Vitória; Iracy Ribeiro Mangueira Marques

tes entre as diretrizes supranacionais e as boas práticas locais, em uma perspectiva de interação
dialética, dialógica e interseccional, em que a posicionalidade dos operadores do direito e dos
destinatários da prestação jurisdicional, quanto à concepção estrutural da política judiciária, não reste invisibilizada nem contribua para a reprodução de processos de exclusão e classificação de
sujeitos, mas que possa, ao contrário, pressagiar possibilidades de novas realidades e estruturas
mais democráticas e menos excludentes.

Considerações finais

Ainda que sejam evidentemente insuficientes para resolver os problemas globais, como a desi-
gual divisão internacional do trabalho e das riquezas, respaldadas pela colonialidade do poder,
do saber e do ser, e a grave crise ecológica que estamos atravessando, entendemos que os ODS podem ser apropriados criticamente e ressignificados desde diferentes perspectivas. Decolonizar
os universalismos e as hierarquizações epistêmicas impostas pelo Ocidente é uma tarefa coletiva
e multidimensional, que pode ser reivindicada desde diferentes lugares.

Sem desconhecer a fundamental importância da luta pela democratização do sistema internacio-nal e da própria ONU (Silva; Boff, 2018), a inadiável reflexão global em torno da insustentabilida-
de de um modelo baseado no crescimento econômico (Latouche, 2009) e, consequentemente, a
imprescindível superação do capitalismo para a sobrevivência da humanidade (Hinkelammert,
2003), como também a necessidade de uma maior pluralidade na composição do Poder Judiciário
brasileiro, articulamos neste artigo ideias que podem permitir uma recepção e aplicação dessa Agenda, especificamente por esse Poder da República, de forma a buscar um aprimoramento qua-
litativo da entrega judicial no país, por meio do fomento de espaços pluriversais e transmodernos,
pautados por dinâmicas, práticas e saberes outros, conectados com as necessidades e as particu-
laridades da nossa realidade.

Enquanto apelo global à erradicação da pobreza, à proteção do meio ambiente e à garantia de que
as pessoas, em todos os lugares, possam vir a desfrutar de uma existência digna, os ODS precisam
ser recepcionados em uma relação dialógica com os desenhos constitucionais dos Estados na-
cionais e instâncias de governança locais. A adesão do Judiciário nacional a essa pauta não pode
prescindir, portanto, de uma interpretação crítica e decolonial, da sua adequação/parametriza-
ção às boas práticas; e da concretização dos direitos humanos fundamentais, mediante processos
estruturais que resultem em uma política judiciária comprometida com o acesso à justiça, com a
promoção social, redução das desigualdades, distribuição de riquezas e com a sustentabilidade ambiental, a desafiar interesses corporativos e de classes que demarcam as estruturas de gover-
nança do Judiciário brasileiro.

Assim, a conformação do Judiciário nacional às diretrizes da Agenda 2030 pode servir como cami-
nho para instaurar relações de “diálogo crítico transmoderno” com as realidades regionais, por meio
da consolidação de boas práticas, das inovações cunhadas no âmbito dos LIODS, da interação com
os espaços de democracia participativa e com a assunção de uma cultura judicial que fomente os
processos estruturais como resposta às ações coletivas e problemas crônicos do Estado brasileiro,
mobilizado pelo desiderato de concretização dos direitos humanos fundamentais. Esse processo re-
quer, ainda, o acolhimento de experiências a assegurar a expressão das diversas posicionalidades, a
aquisição de competências relacionais e articulação argumentativa dos seus nacionais.

17

A incorporação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável

A concepção de um projeto de governança judiciária transmoderno e pluriversal, capaz de superar
a verticalização de uma política de sustentabilidade e promoção social ocidentalcêntrica, precisa
dialogar com as contribuições dos movimentos de resistência, das comunidades originárias, tra-dicionais e periféricas, desafiando um equilíbrio de poderes alinhavado por uma interface radi-
calmente democrática, inclusiva e ancorada na proteção dos direitos humanos fundamentais, na
superação das desigualdades materiais, na concepção de outras epistemologias e comprometida
com a autonomia dos sujeitos invisibilizados pelos instrumentos de poder a serviço das estruturas
coloniais, imperialistas, capitalistas, patriarcais e opressoras.

Referências

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A incorporação do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável

The implementation of SDG
16 by the Brazilian Judiciary: possibilities
and limits through a decolonial
perspective

Abstract:
This article analyzes, from a critical perspective of
coloniality, the possibilities and limits arising from
the incorporation of the United Nations (UN) 2030
Agenda by the National Judiciary, precisely with
regard to Sustainable Development Goal (SDG) 16. At first, we list some of the main normative as-
pects regarding the adherence to this agenda and
the reception of the United Nations Development
Program (UNDP) as consequences of a concern of
the board of the Brazilian Justice with the quality
and improvement of the jurisdictional delivery. We
proceed with a critical analysis on the universality
of the western human rights conceptions, relating
it to the concept of coloniality of power, by Aníbal
Quijano (1992). Next, we discuss the idea of devel-
opment that underlies the mentioned SDG, taking
into account the structurally dependent capital-
ism that characterizes our region, as well as the
paradoxes of economic growth as an implicit crite-
rion in the UN agenda. Finally, in view of these re-flections and considering the limits of hegemonic
conceptions of human rights and development, we
propose a discussion on some structural, contex-
tual and intersectional conditions that challenge
the construction of new methodologies, media-
tions and tools that can allow the integration of
this agenda by the Judiciary. We point out some
possible horizontal, dialogic, transmodern and
pluriversal paths consistent with the particular-ities, material contradictions and specificities of
the Brazilian reality.
Keywords: Sustainable Development Goals
(SDGs). Judicial power. Improvement of jurisdic-
tional services. Coloniality. Pluriversality.

La incorporación del Objetivo de
Desarrollo Sostenible 16 por el Poder
Judicial brasileño: posibilidades y límites a
la luz de una perspectiva decolonial

Resumen:
Este artículo analiza, desde una perspectiva crítica
de la colonialidad, las posibilidades y límites que
se derivan de la incorporación de la Agenda 2030
de las Naciones Unidas (ONU) por parte del Poder
Judicial de la nación, precisamente en lo que se refiere al Objetivo de Desarrollo Sostenible (ODS)
16. En un primer momento, enumeramos algunos
de los principales aspectos normativos relaciona-
dos con la adhesión a esa agenda y la recepción del
Programa de las Naciones Unidas para el Desar-
rollo (PNUD) como consecuencias de una preocu-
pación del máximo órgano de la Justicia brasileña
con la calidad y mejora de la impartición judicial.
Procedemos con un análisis crítico de la preten-
sión de universalidad de la visión occidental de
los derechos humanos, relacionándola con el con-
cepto de colonialidad del poder, de Aníbal Quijano
(1992). A continuación, discutimos el concepto de
desarrollo que subyace el ODS en cuestión, tenien-
do en cuenta el capitalismo estructuralmente de-
pendiente que caracteriza a nuestra región, como
también las paradojas del crecimiento económico
como criterio implícito en la agenda de la ONU. Fi-nalmente, frente a esas reflexiones y considerando
los límites de las concepciones hegemónicas de
derechos humanos y desarrollo, proponemos una
discusión sobre algunas condiciones estructurales,
contextuales e interseccionales que interpelan la
construcción de nuevas metodologías, mediacio-
nes y herramientas que permitan la integración
de esa agenda por el Poder Judicial. Señalamos
algunos posibles caminos horizontales, dialógicos,
transmodernos y pluriversales, acordes con las
particularidades, contradicciones materiales y es-pecificidades de la realidad brasileña.
Palabras clave: Objetivos de Desarrollo Soste-
nible (ODS). Poder Judicial. Mejoramiento de los
servicios jurisdiccionales. Colonialidad. Pluriver-
salidad.