TOMO. N. 39 JUL./DEZ. | 2021

Políticas Sexuais, Saúde e Violência em
Tempos de Pandemia da Covid-19

Marcelo Tavares Natividade*1

Bruno Alves de Sousa**2

Rômulo do Nascimento Rocha***3

Resumo
O artigo aborda a política sexual no Brasil contemporâneo, com foco na saúde sexual e na política direcionada às populações LGBT. Identifica
desmontes que ocorreram nos últimos anos ao analisar atos governa-
mentais, linhas de força, conteúdos e mensagens. A pandemia da Co-
vid-19 surge como drama social que evidencia a vulnerabilidade das
minorias e a negligência do Estado, articulando marcadores sociais da
diferença e política pública. O artigo problematiza a progressiva mo-
ralização da agenda estatal com a ocupação de lugares de poder por
atores conservadores e fundamentalistas. Argumenta que mudanças
na gestão operam o reforço do preconceito e o apagamento das iden-
tidades coletivas, bem como impactam o acesso a serviços e políticas
de saúde e proteção social. O texto inova ao oferecer diagnóstico da política pública através de abordagem etnográfica que avalia as ações
do Estado e as respostas da sociedade, evidenciando enlaces entre vio-
lência, sexualidade e saúde.
Palavras-chave: Políticas sexuais e de gênero. Saúde. Violência. HIV-
-AIDS. COVID-19.

* Docente, Universidade Federal do Ceará. E-mail: natividademarcelo@gmail.com
** Pós-graduando em Antropologia UFC-UNILAB.
*** Graduando em Ciências Sociais, UFC.

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POLÍTICAS SEXUAIS, SAÚDE E VIOLÊNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19

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Sexual Politics, Health and Violence in Pandemic
Times of Covid-19

Abstract
The article discusses sexual politics in contemporary Brazil, with a fo-
cus on sexual health and politics directed at LGBT populations. It iden-tifies dismantling that has occurred in recent years, analyzing gover-
nmental acts. The Covid-19 pandemic emerges as a social drama that
highlights the vulnerability of minorities and the neglect of the State,
articulating social markers of difference and public policy. The article
problematizes the moralization of the state agenda, the conservative and fundamentalist influence. I argue that changes in management
reinforce prejudice and promote the erasure of collective identities, as
well as impacting access to health services and policies. The text inno-
vates by offering an analysis of public policy through ethnography that
connects the State, violence, sexuality.
Keywords: Sexual and gender policies. Health. Violence. HIV/AIDS.
COVID-19.

Políticas Sexuales, Salud y Violencia en Tiempos de
Pandemia de la Covid-19

Resumen:
El artículo trata sobre la política sexual en el Brasil contemporáneo,
con un enfoque en la salud sexual y la política dirigida a las poblaciones LGBT. Identifica los desmontajes que se han producido en los últimos
años al analizar actos gubernamentales, contenidos y mensajes. La
pandemia Covid-19 surge como un drama social que resalta la vulne-
rabilidad de las minorías y el descuido del Estado, articulando marca-
dores sociales de diferencia y política pública. El artículo problematiza
la progresiva moralización de la agenda estatal con la ocupación de
lugares de poder por parte de actores conservadores y fundamenta-
listas. Sostiene que los cambios en la gestión refuerzan los prejuicios
y borran las identidades colectivas, así como impactan el acceso a los

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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Introdução

O campo das Ciências Sociais se volta para a compreensão de
sexo e gênero e suas intersecções aos processos saúde-doença
há quatro décadas no Brasil, incrivelmente impulsionado pelo
debate público sobre a epidemia de HIV/AIDS (Vance, 1995) e
seus posteriores enlaces ao tema dos direitos sexuais e repro-
dutivos (Carrara e Vianna, 2008; Vianna e Lacerda, 2004). Este
artigo se alinha ao debate, com foco nas ditas políticas sexuais,
colocando em discussão os enlaces entre Estado e direitos sexu-ais enquanto objeto de reflexão científica que busca, com o olhar
das Ciências Sociais, produzir diagnóstico técnico ao campo da
política pública brasileira e sua relação com lutas sociais con-
temporâneas.

A noção de políticas sexuais tem vantagens em muitos sentidos,
visto que “possibilita a abordagem conjunta de diferentes tipos
de ação social dirigidos ao Estado ou promovidos em seu âmbi-
to ou sob sua chancela: legislações, campanhas sanitárias, pro-
gramas educativos, normativas ministeriais, decisões judiciais,
diferentes ativismos e movimentos sociais, etc.” (Carrara, 2015,
p. 325). Possibilita olhar para a relação do Estado com organis-
mos internacionais e compromissos assumidos que organizam
as agendas de direitos humanos e políticas no campo do gênero
e sexualidade.

Por um lado, revela modos de regulação da sexualidade pela
ciência, pelas religiões, pelo direito e pelo Estado. Por outro,

servicios y políticas de salud y protección social. El texto innova al ofre-
cer un diagnóstico de política pública a través de un enfoque etnográ-fico que evalúa las acciones del Estado y las respuestas de la sociedad,
mostrando vínculos entre violencia, sexualidad y salud.
Palabras clave: Políticas sexuales y de género. Salud. Violencia. VIH-
-SIDA. COVID-19.

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inspira a etnografia das controvérsias sobre sexo e gênero que
acentuam embates entre atores com diferentes visões de mun-
do, implicadas no reconhecimento público de novos sujeitos
de direitos e identidades coletivas, incluindo tensionamentos, disputas e relações de poder nas demandas específicas. Esse conjunto de questões serve de mote a uma análise das configu-
rações de políticas sexuais no contexto de ameaça aos direitos
e de narrativas hostis às minorias. O artigo avançará no conhe-
cimento das ações do Estado durante a pandemia da Covid-19.
Primeiramente, apresentamos o escopo maior da investigação
que fornece as informações aqui examinadas. Em seguida, o
foco estará na saúde sexual, considerando ser essa uma das áre-
as da governança pública mais controversas e objeto de múlti-plas interferências. Por fim, apresentará uma reflexão sobre a
pandemia e a atuação em relação às minorias sexuais. No arti-
go, abrimos mão de análise mais particularizada em eventos da
gestão de Michel Temer para focar nas ações que transcorrem
na passagem ao bolsonarismo, quando Jair Messias Bolsonaro
chega ao poder, nas eleições de 2018. A ocupação de lugares de
poder em ministérios estratégicos pôs em curso práticas que re-
forçam visões de mundo conservadoras e políticas que, ao invés
de proteção social, desamparam e fragilizam ainda mais as mi-
norias sexuais e demais populações socialmente vulneráveis. A hipótese a seguir ampara-se em reflexão proposta pela filósofa
Judith Butler (2018), para quem a construção de redes de apoio
e proteção social propicia a certas populações as condições para
que vidas possam ser vividas, enquanto outras, relegadas ao de-
saparecimento, são postas às margens do Estado, transformadas
em não-vidas, experiências de precariedade numa avassaladora
insegurança objetiva e subjetiva, com pouco ou nenhum acesso
a políticas de saúde, moradia, educação, segurança pública, pre-
vidência e assistência social. Certas vidas são socialmente fei-
tas para serem precárias, tendo sua dignidade e direitos básicos
violados constantemente pelo Estado e suas redes e sistemas
de governança (Natividade, 2016). Essas questões anunciam a
intenção de levar a sério a análise das relações entre vulnerabili-

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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dades sociais e as respostas/decisões/atos do Estado, as instabi-
lidades e os inacabamentos da política pública (Birman, 2016).
Pretende-se aprofundar o olhar para o campo da saúde pública e abordar atos oficiais de governos, campanhas sanitárias, dados
sobre o acesso a tais políticas e sobre a violência que afeta al-
gumas minorias sexuais, o reconhecimento e proteção social de
algumas identidades coletivas ou a desconsideração delas pelo
Estado. Interessa focalizar em ações e reações de entidades da
sociedade civil a formas de atuação política no campo dos direi-
tos sexuais e reprodutivos. Em suma, a análise da política sexual
brasileira na atualidade, incluindo os impactos da pandemia da
Covid-19. Vejamos o contexto da produção dos dados e a sua an-
coragem institucional.

1. O Observatório Nacional da Política LGBT e o
mapeamento das ações do Estado

Os materiais discutidos foram obtidos em ampla pesquisa no
Laboratório de Estudos sobre Marcadores Sociais da Diferença
(LAMAS) e no Observatório Nacional da Política LGBT1, projeto
de extensão do Departamento de Ciências Sociais da Universi-
dade Federal do Ceará, que realiza: intervenção, diálogos com
gestores, ativistas e pesquisadores de outras universidades, or-ganização de Grupos de Trabalho em congressos científicos na-
cionais e internacionais, produção de diagnósticos e dossiês de
avaliação da política pública.

O trabalho foi fruto do diálogo com parlamentares de distintas
Casas Legislativas brasileiras que compartilham conosco a pre-
ocupação com os desmontes da política para minorias na cena

1 A preocupação com as populações LGBT foi o mote da criação desse núcleo de pesquisa
LGBT na Universidade. Agradecemos à Deputada Federal Luizianne Lins (Partido dos
Trabalhadores) pelo apoio em ações de ensino, pesquisa e extensão, através das emen-
das parlamentares nº 37100013 EIND e 37100014 EIND.

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contemporânea. Teve como pergunta de partida: qual a situação das políticas específicas para LGBT após o golpe que afastou
a Presidenta Dilma Rousseff da Presidência da República em
2016? O cenário de crise política, culminando na eleição do Pre-
sidente Jair Bolsonaro, seria coincidente com a fragilização da
proteção social dessas populações, implicando em retrocessos
e rupturas na relação com os movimentos sociais? Entre 2018 e
2020, o núcleo dedicou-se a três frentes de ação. Primeira fren-
te: monitoramento de mídias nos principais veículos de comuni-
cação (jornais, revistas, portais de imprensa nacionais ou locais
e alternativos), capturando o que foi noticiado sobre políticas
LGBT e áreas correlatas. Os materiais foram sistematizados em
base de dados própria do projeto, organizando-se em dossiês
temáticos: Saúde (com destaque para Covid-19), Ciência, Edu-
cação, Meio Ambiente, Direitos Humanos, Justiça e Segurança
Pública, Cultura e Arte, Participação Social e Assistência Social.
Segunda frente: investigação documental, com catalogação de atos oficiais do Poder Público, como leis, decretos, portarias, notas técnicas, diários oficiais, decisões judiciais, conformando
um vasto corpus de pesquisa. Terceira frente: entrevistas com
ativistas e gestores públicos de Ceará, Bahia e Rio de Janeiro,
como fase exploratória. Essa pluralidade de técnicas possibilita
a construção de análises em profundidade, de modo a elucidar o
contexto e as relações entre políticas LGBT e as ações do Estado,
na interseção com distintas áreas da governança pública2.

Apesar de um corpus de pesquisa extenso, o recorte aqui
corresponde ao inventário parcial de políticas sexuais, in-corporando reflexão sobre ações do Estado brasileiro na pandemia da Covid-19, identificando violações de direitos
humanos. Amparamo-nos em uma concepção performa-
tiva da política, baseada em teorias da performatividade

2 A pesquisa documental procedeu ao arquivamento total de 1.010 documentos ao todo.
Constam 784 textos de mídia, sendo 499 deles na primeira fase de sistematização e mais 285 da segunda fase de sistematização. Incluem também 100 atos oficiais do Poder Público.

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como as de Austin (1976) e Butler (2018), para quem dizer é fazer. Então, observamos discursos públicos, falas oficiais,
destaques na mídia, decretos, portarias, legislações, votos
e pareceres, declarações à imprensa e notas públicas para
que se cumpram os propósitos do artigo.

Vejamos como se desenvolvem controvérsias e atuações espe-cíficas no campo da saúde sexual e, em especial, a política de
HIV/AIDS. Argumentamos que mudanças estruturais nessa área
afetaram conteúdos, formas de agir e diálogos com a sociedade civil, produzindo políticas e mensagens específicas que nos cabe
compreender.

2. A política de HIV/AIDS: tensionamentos, ocultações,
atos do Estado e acesso a serviços

Ao investigar a política sexual e, em especial, LGBT, foram imedia-
tas as descobertas de alterações no campo da saúde. Isso se anun-
ciou no exame de dados que sustentam essa análise: materiais de
mídias, campanhas de saúde, decretos, portarias, notas técnicas e outros atos oficiais. Assim, foram mapeadas mudanças técnicas,
de modo a levantar suas linhas de ação, as mensagens, os este-
reótipos que as permeiam. Que conteúdos, construções textuais
e imagéticas evocam e aparecem como linha discursiva da políti-
ca pública em saúde sexual no Brasil contemporâneo e como elas
conformam ou não uma política sexual ou política LGBT?

No tocante às políticas de saúde são manifestas alterações es-
truturais. O Presidente Bolsonaro já manifestava, durante a cam-
panha eleitoral, críticas moralizadoras à política de HIV/AIDS,
declarando ser “injusto” o Estado Brasileiro arcar com custos de
prevenção e tratamento de “pessoas promíscuas”, indicando a
intenção de restringir tecnologias de prevenção e tratamento no
Sistema Único de Saúde (SUS). Esse fato nos serviu de alerta.

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Logo nos primeiros meses da atual gestão, foi renomeado
o Departamento que atua na formulação de políticas pú-
blicas de controle e redução da transmissão do HIV e ou-
tras Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST). A área do
Ministério da Saúde que oferece esses serviços para popu-
lação a partir do SUS já teve status de programa, coorde-
nadoria e antes da denominação atual se chamava Depar-
tamento de Vigilância, Prevenção e Controle das Infecções
Sexualmente Transmissíveis, do HIV/AIDS e das Hepatites
Virais (DIAVH).A nomenclatura foi modificada em 2019, através do Decreto Nº
9.795, de 17 de maio, que aprovou nova estrutura regimental
no Ministério da Saúde3. A mudança de nome é destacada pela
retirada da palavra AIDS, passando o setor a se chamar Depar-
tamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexual-mente Transmissíveis (DCCI). A modificação aconteceu alguns
meses depois do então Ministro da Saúde Henrique Mandetta4
declarar em entrevista que o governo eleito iria promover po-
líticas de prevenção “sem ofender às famílias” (Folha de S. Pau-
lo, 2018). Além de externar a percepção de que o Estado não
deveria “banalizar” o que ele entende como “comportamentos
de risco”, distribuindo remédios gratuitos no SUS. O fato foi uma crítica explícita à política de distribuição da PrEP (Profilaxia Pré--exposição) e PEP (Profilaxia pós-exposição) que fazem parte da
Política Nacional de Prevenção Combinada do HIV. O modo como se nomeia, classifica e rotula unidades, departamentos, setores
dos sistemas públicos, pensamos, é indicativo das linhas de pen-
samento e ação que orientam a política pública e isso é o que se

3 O referido decreto “aprova a Estrutura Regimental e o Quadro Demonstrativo dos Car-gos em Comissão e das Funções de Confiança do Ministério da Saúde, remaneja cargos em comissão e funções de confiança, transforma funções de confiança e substitui cargos
em comissão do Grupo-Direção e Assessoramento Superiores – DAS por funções Comis-
sionadas do Poder Executivo – FCPE”.
4 Médico, Luiz Henrique Mandetta foi Ministro da Saúde no governo Bolsonaro durante
1º de janeiro de 2019 até 16 de abril de 2020.

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pretende explorar nas próximas páginas. Nesse caso, a ocultação
do termo AIDS no setor é acompanhada de esforços para o apa-
gamento de certas identidades coletivas, para a moralização da
política pública e para obstruções no acesso a serviços em saúde
sexual. Vejamos outros aspectos dessa complexa relação entre
Estado, direito à saúde e minorias sexuais.

Na composição dos quadros gestores, merece destaque a notícia
de que Adele Benzaken, diretora do então Departamento de HIV/
AIDS e Hepatites Virais (antigo DIAVH), responsável pela política
de prevenção e controle de infecções sexualmente transmissí-
veis, fora exonerada e substituída pelo médico epidemiologista
Gerson Fernando Mendes Pereira, em 11 de janeiro de 2019 (G1, 2019). A decisão foi tomada sob a justificativa de que haveria
novos direcionamentos na pasta e seus quadros técnicos. Em
face do ocorrido, diversas entidades, ONGs e associações comu-
nitárias emitiram notas de repúdio sobre a demissão da diretora
daquele Departamento. Para os movimentos e ONG-AIDS, a exo-
neração impactava o acesso a novas tecnologias em prevenção como a PrEP e PEP, muito eficazes na prevenção da infecção pelo
HIV e responsável pela diminuição nos números de infecção no
país. Representava grave perda técnica no quadro da política de
combate à epidemia e da política em saúde sexual.Outro fato significativo para análise foi a restrição da circulação
de informação sobre HIV/AIDS e outras IST nas redes sociais oficiais do DCCI (Carta Capital, 2019). A página oficial continha materiais diversos sobre HIV e outras IST, configurando uma
ferramenta de promoção de saúde sexual e democratização de
conhecimento. O encerramento das páginas restringia a difusão
e o acesso a informações sobre tratamento e sobre programas de saúde disponíveis. A desativação dos perfis com esse serviço foi oficializada através de comunicados nas redes sociais oficiais
do Departamento (Twitter, Facebook e Instagram), entre os dias
23 e 24 de julho de 2019. Na chamada, um post foi publicado
com a seguinte mensagem: “ATENÇÃO – A partir de hoje, esta

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página não será mais atualizada. Os novos conteúdos serão pos-tados nas redes oficiais do Ministério da Saúde. Contudo, para
garantir o histórico de postagens, a página não será apagada e
poderá ser usada para consultas”. Do mesmo modo, foi retirada
de circulação uma cartilha voltada à saúde dos homens trans (O Estado de S. Paulo, 2019), sob a justificativa hesitante de que ha-
veria correções no documento que foi divulgado em 2 de janeiro
de 20195. Os movimentos interpretaram esses fatos como grave
retrocesso, que prejudicaria o acesso da população a informa-
ções básicas sobre o HIV/AIDS (prevenção, testagem, acesso a
tratamentos pelo SUS), pois a disponibilização dos conteúdos fa-
zia parte das estratégias para controle e prevenção ao HIV e ou-
tras IST. A Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS (ABIA)
lançou, em 25 de julho de 2019, uma nota em que reprovou a
desativação: “Repudiamos com veemência o plano em curso de
migrar os diversos sites com serviços e informações (...) para
uma única plataforma governamental (...) A medida põe em ris-
co o acesso a dados com transparência e o acesso aos direitos
pela população (...)”.

Também campanhas de prevenção do HIV e IST do Ministério da
Saúde merecem atenção. Em 31 de outubro de 2019, foi lança-da uma campanha que repercutiu negativamente entre profis-
sionais, movimentos sociais e ONGs. O material espalhado pelo
espaço público (outdoor, cartazes no trem e no metrô, aeropor-
tos, escolas públicas e hospitais) apresentava uma imagem em
sequência de três pessoas observando no celular imagens de indivíduos acometidos por sífilis, gonorreia e herpes genital. A
revelação das supostas descobertas mostrava reações de nojo,

5 A cartilha “Homens Trans: vamos falar sobre prevenção de Infecções Sexualmente
Transmissíveis?” informa sobre prevenção, cuidados pessoais e direitos dos homens
trans no SUS. Elaborada pelo Ministério da Saúde, DIAVH, com a colaboração de mem-
bros da RedeTrans Brasil e do Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (IBRAT), tem conteúdo voltado especificamente para homens trans, através de textos, gravuras, infor-
mações técnicas, tendo sido formulada em linguagem visual com as cores da bandeira
trans (branco, rosa e azul).

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repulsa e susto, seguindo-se à imagem o texto: “Se ver já é desa-
gradável, imagine pegar. Sem camisinha você assume o risco de
pegar uma IST”.

Um vídeo da campanha, disponível no YouTube e publicado na
mesma data, tem a participação de sete jovens, sendo duas mu-
lheres negras e uma branca, um homem negro e três brancos, na
faixa etária de 20 e 29 anos. Eles são convidados a sentar em uma
cadeira, sendo indagados por um narrador: “Você já viu os sin-
tomas de algumas infecções sexualmente transmissíveis?”. Ocor-
rem algumas negativas. Uma mulher responde que viu “em aula
de Biologia”. Uma legenda explica: “Convidamos alguns jovens a
pesquisar os sintomas de infecções sexualmente transmissíveis –
IST”. Uma pausa é seguida do ato da pesquisa em celulares e das
respectivas reações que expressam incômodo, nojo e estranha-
mento. As palavras completam a mensagem da campanha: “Nos-
sa! Assusta hein?”; “Cancro mole me assustou bastante”; “A cara da gonorreia é bem feia”. Ao fim do vídeo a mesma frase da di-
vulgação impressa: “Se ver já é desagradável, imagine pegar. Sem
camisinha você assume o risco de pegar uma IST”. O audiovisual finaliza com atores mostrando preservativos ao espectador. Em
2020, outra campanha foi lançada, dessa vez com a chamada “Usar
camisinha é uma responsa de todos”. Apesar de trazer um vídeo com personagens também jovens, com fins de dialogar com esse
público de 15 a 29 anos, mais uma vez tem abordagem controver-
sa e generalista. A mensagem inicia com um alerta: “eu já sei, mas
você já sabe que além de evitar a gravidez, ela protege do HPV, HIV e outras IST?”, “Sífilis, gonorreia, hepatites B, C”. Junto ao áudio,
são exibidas imagens dos sintomas manifestados no corpo em de-
corrência de algumas IST. Na sequência das imagens, uma jovem
aparece no banheiro explicando: “se põe em risco a minha saúde,
põe em risco a sua também”. “A responsa é minha, mas também é
sua”, diz uma garota, no ambiente de uma festa, completando: “ou
vai tentar me dar desculpas para arriscar só por este momento?” Os atores do vídeo dizem em uníssono: “para que ainda ficar em
dúvida se precisa ou não usar e arriscar sua saúde nessa perigosa

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loteria?” Na continuidade das cenas, os sons de portas e grades
se fechando em alto volume e com ruídos estranhos completam
o clima de suspense, construído propositalmente no alerta per-
suasivo: ser infectado pelo HIV ou outra IST é terrível e temível.
A narração ao espectador em tom sério, intimidatório, os olhares atentos e desconfiados dos atores completam a mensagem: cui-
dado com quem não usa o preservativo. A campanha audiovisual,
assim como a mencionada anteriormente, não apresenta outras
formas de prevenção ao HIV/AIDS e outras IST, além do uso do
preservativo, evidenciando a invisibilização de novas tecnologias
preventivas em uso no Brasil, como PrEP e PEP. Também merece
destaque a linguagem de medo e pânico performada, caracteri-
zando um tipo de mensagem que não elimina os estereótipos e
preconceitos. Pelo contrário, até os alimenta.

O uso de tecnologias de prevenção está, então, articulado menos ao cuidado que ao medo do outro. Com efeito, verifica-se ain-
da o apagamento de certas identidades sexuais e de gênero do
comercial, pois não estão presentes de modo explícito pessoas
LGBT na campanha. A linguagem é generalista e direcionada ex-
clusivamente a um método: o preservativo externo6.

O monitoramento da pesquisa no campo das ações em saúde
pública mostrou que o mês de dezembro, por ocasião do Dia In-
ternacional da Luta contra a AIDS, comemorado no primeiro dia, compreende a intensificação de ações e mobilizações. Apesar
disso, o ano de 2020 foi marcado por atos do Estado que eviden-
ciam a fragilização da política de HIV/AIDS.

No dia 2 de dezembro, o DCCI lançou uma nota informativa
sobre a “suspensão da coleta das amostras para os exames de

6 Os movimentos trans têm utilizado recentemente a expressão “preservativo externo”
para se referir aos métodos vulgarmente conhecidos como “camisinhas masculinas”, haja
vista o incômodo de mulheres trans e travestis (do gênero feminino) também fazerem
uso desse recurso.

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genotipagem do HIV e da genotipagem do HCV”. O exame de ge-
notipagem é realizado para que sejam detectadas mutações no
genoma viral que causam resistência aos medicamentos utili-
zados no tratamento, normalmente composto pela combinação
de fármacos de algumas classes, resultando na Terapia Antirre-
troviral (TARV). É somente a partir dos resultados desse exame
que é realizada uma nova combinação de medicamentos para
adesão e continuidade ao tratamento. O anúncio do governo
acabou por introduzir novas tensões com setores da sociedade
civil, quando a imprensa, movimentos e ONGs AIDS denuncia-
ram a suspensão de tais testes e a consequente oferta de tra-
tamentos adequados como um grave prejuízo aos usuários do
SUS e ao “direito à saúde”. O fato é informado em inúmeras re-
portagens em veículos de amplo acesso7. As notícias informam
sobre falhas na renovação de contratos responsáveis pelos in-
sumos desse serviço (“vencido” ou “não renovado”), devido a
supostos entraves burocráticos: pregão eletrônico fracassado,
não entrega de documentos exigidos em edital pela empresa
vencedora, etc., conforme informa também a Agência AIDS, em
7 de dezembro de 2020.

Na sequência dos acontecimentos, a Rede Nacional de Pessoas
Vivendo com HIV e AIDS (RNP+Brasil) lançou uma nota de repú-
dio (2019) à falta de exames de genotipagem e de remédios no
SUS, denunciando que o fato era reincidente e demonstrava a
intenção do governo em prejudicar a mundialmente reconheci-
da política brasileira de prevenção e tratamento da AIDS. Mere-
ce destaque na nota a queixa dos movimentos sobre a ausência
de diálogo com o Departamento: “Em tempos passados éramos

7 São alguns títulos: Isto É (“Governo suspende exames de HIV, aids e hepatites virais no
SUS”, 7 de dezembro de 2020), Revista Veja (“Descaso com a saúde pública: Bolsonaro
está cada vez mais convicto de que a saúde pública não lhe diz respeito”, 9 de dezembro de 2020), Portal G1 (“Atraso em licitação suspende exame que define tratamento para HIV
e hepatite C”, 8 de dezembro de 2020), Jornal Estadão (“Governo deixa contrato vencer e
suspende exames de HIV/AIDS e hepatites virais no SUS”, 7 de dezembro de 2020) e Jornal
Nexo (“A suspensão de exames de genotipagem de HIV via SUS”, 8 de dezembro de 2020).

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vistos e tratados como parceiros e agora somos despesas”, diz o
fragmento da nota assinada pela Rede.

Para além da política nacional, a pesquisa evidenciou também
os impactos locais da falta de transparência da atual política em
HIV/AIDS em sua nova gestão. Por exemplo, ainda na primeira
quinzena de dezembro de 2020, notícias da imprensa informa-
ram a falta de medicamentos para tratamento na rede SUS do
Ceará, além de informar o estoque baixo de outros medicamen-
tos8. Segundo reportagem publicada no Portal G1-CE, em 15 de
dezembro de 2020, a suspensão do uso de tais fármacos, em
plena pandemia da Covid-19, impactava a efetividade do trata-
mento, levando ao enfraquecimento do sistema imunológico da
pessoa e possíveis infecções oportunistas. Segundo as críticas, o
problema de fornecimento, decorrente da falta de repasses do
Ministério da Saúde, prejudicou o atendimento nas Unidades de
Referência que não conseguiram seguir normatizações da polí-
tica nacional de HIV/AIDS de fornecer estoques para 90 dias, ao
invés do usual, de apenas para 30 dias. Tal medida fora estabe-
lecida de modo a impedir aglomerações nos serviços de saúde
durante a pandemia, evitando visitas frequentes aos postos de
retirada e minimizando o risco de contaminação pela Covid-19
em pessoas que vivem com HIV/AIDS. Diante disso, uma mobili-
zação da Rede Nacional de Pessoas vivendo com HIV e AIDS-Ce-ará (RNP+CE) enviou ofício ao Ministério da Saúde solicitando
a normalização dos estoques, sendo informada posteriormente
sobre a suposta previsão de normalização para janeiro de 2021.
A controvérsia é mais um indicativo das movimentações rela-
cionadas aos quadros técnicos e alterações que afetam a política
nacional em saúde sexual desde o golpe, conforme vimos. Veja-
mos outros fatos, sob a luz dessa análise.

8 Dentre as medicações mencionadas estão o Lamivudina, Raltegravir e Etravirina com
baixo estoque. O Kaletra, usado para infecções ao HIV em crianças, segue “em falta” na
rede cearense.

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No Brasil, o último mês do ano ganhou mobilização regulamen-
tada pela Lei nº 13.504, de 7 de novembro de 2017, que veio
a instituir a Campanha Nacional de Prevenção ao HIV/AIDS e
outras IST, o Dezembro Vermelho. Esse mês foi escolhido pelo
Ministério da Saúde em virtude do Dia Mundial de Combate à
AIDS (1° de dezembro), data decidida na Assembleia Mundial de
Saúde, em 1987, com apoio da Organização das Nações Unidas
(ONU). Durante todo o mês, são realizados eventos, discussões, lançamentos de dados oficiais e boletins, com atualizações
sobre novas tecnologias de prevenção e tratamento.

Apesar das mobilizações importantíssimas que dão visibilidade
pública ao controle da epidemia, segundo a ONU, o Brasil não
cumpriu a meta 90-90-90, estabelecida pelo Programa Conjunto
das Nações Unidas sobre HIV/Aids (UNAIDS), no qual é signa-
tário. A iniciativa foi lançada na Conferência Internacional de AIDS em Melbourne, em 2014. Essa meta mundial definia que
no período de 2015 até 2020, 90% das pessoas deveriam saber
seu estado sorológico, 90% dos que vivem com HIV deveriam
ter adesão ao tratamento de forma ininterrupta e, por último,
90% delas deveriam ter carga viral indetectável, pois resultaria
em qualidade de vida e inviabilizaria a transmissão do vírus via
contato sexual. Esse compromisso da política brasileira com o
pacto internacional para a redução das infecções pelo HIV, adoe-
cimento e óbitos decorrentes da AIDS, por um lado, mostra a im-
portância de tais pactuações para avanços locais. Por outro lado,
o descumprimento de tais metas evidencia fragilidades técnicas e sugere a importância da investigação científica dos entraves,
seja políticos, culturais, econômicos, seja religiosos, a conformar
e impactar a política pública brasileira, como o esforço que faze-
mos neste texto.

O último Boletim Epidemiológico de número especial, do DCCI,
alocado na Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) do Ministé-
rio da Saúde, publicado em 1° de dezembro de 2020, mostra que
atualmente cerca de 920 mil pessoas vivem com HIV no Brasil.

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POLÍTICAS SEXUAIS, SAÚDE E VIOLÊNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19

TOMO. N. 39 JUL./DEZ. | 2021

Levando em consideração a meta, 89% foram diagnosticadas,
77% estão em tratamento com antirretroviral e 94% delas ti-
veram carga viral indetectável. Segundo notícia publicada no
Portal Viva Bem9, em 8 de dezembro de 2020, “para especialis-
tas ouvidos (...) o não cumprimento da meta pelo Brasil se deve,
principalmente, ao teor das campanhas informativas que, em ge-
ral, ainda estão mais focadas no uso da camisinha que na propa-
gação de informações relativas à prevenção combinada (...)”. Por fim, os eventos destacados nesta seção lançam luzes na análise
de quadros gestores, no contexto político atual, nas linhas ideo-
lógicas que perpassam a política pública voltada para HIV/AIDS,
nos seus conteúdos e mensagens, além das fragilidades técnicas
no acesso aos serviços de saúde sexual. Na seção seguinte, alar-
gamos o foco, abordando saúde sexual no contexto da pandemia
da Covid-19, mas também observando as relações do Estado
com outros grupos sociais, em especial mulheres e LGBT.

3. Política sexual, violência e pandemia de COVID-19 no
Brasil

Depois da discussão acima sobre os impactos das alterações
técnicas nas políticas de AIDS e seus efeitos sobre populações
vulneráveis, o intento é aprofundar um pouco mais acerca da
fragilização na atual política da proteção social às minorias se-
xuais. Em razão do contexto em que este artigo é construído, é
condição que o tema da pandemia da Covid-19 faça parte das reflexões, ainda que de modo preliminar. Nesse sentido, não se pretende fazer uma pormenorizada reflexão sobre as políticas
de saúde no combate ao novo coronavírus no país, mas pro-
vocar uma problematização de formas de esfacelamento das
redes de apoio do Estado às minorias sexuais em certo sentido;
em outro, as formas de violência que perpassam essa relação

9 Canal de saúde e bem-estar do site UOL que possui informações confiáveis e embasa-das cientificamente, dicas de saúde testadas e orientações de especialistas.

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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e a intensificação dessas vulnerabilidades. A pandemia acaba por configurar uma espécie de drama social (Turner, 1982),
que evidencia muitas contradições e, em outro aspecto, se con-
verte em um problema das ações, decisões, das assinaturas do
Estado (Das, 2014; Natividade e Oliveira, 2016) na produção
de centros e margens da política (Natividade, 2016). A seção
vai explorar os nexos entre pandemia, saúde pública e marca-
dores sociais da diferença, implicados nos atos do Estado de reconhecimento e proteção de populações específicas ou au-
sência destes. Abordará decisões que evidenciam a violação
de direitos e violência do Estado, amparadas em fundamenta-
lismos políticos e/ou religiosos, em hostilidades às minorias
sexuais, performadas por agentes públicos (Nagamine e Nati-
vidade, 2016). Interessa aqui, o inventário dessas formas de
hostilidade e perpetuação de desigualdades estruturais nos
sistemas de governança pública.

A pandemia da Covid-19 trouxe profundas mudanças no co-
tidiano das pessoas em todo o mundo. Contudo, a divulgação
de informação científica e o debate na mídia revelam as de-
terminantes sociais do processo saúde-doença em níveis lo-
cais. Grupos sociais específicos são afetados de modo distinto
pela pandemia, em diferentes contextos nacionais. Por essa
razão, achamos oportuno mencionar uma reflexão científica
mais recente sobre o contexto atual e a perspectiva de uma
sindemia.

O conceito de sindemia foi formulado pelo antropólogo estadu-
nidense Merrill Singer no início dos anos 1990, no contexto das
pesquisas sobre o HIV/AIDS em comunidades pobres e negras
nos EUA. Professor de Antropologia na Universidade de Connec-
ticut, ele destaca-se na área da antropologia médica. Segundo
Singer (1996), as comunidades mais impactadas por novas epi-
demias são aquelas que já enfrentavam outras ameaças à sua saúde. No caso específico, tratava-se de endemias como outras
IST, hepatites, cirrose, mortalidade infantil, abuso de drogas, sui-

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POLÍTICAS SEXUAIS, SAÚDE E VIOLÊNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19

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cídio, homicídio, entre outras. Essas ocorrências se relacionam
com um cenário mais amplo de fatores político-econômicos e
sociais. Não apenas coocorreram. A sinergia entre as epidemias
é cada vez pior (Singer, 1996). Por sua vez, o professor do Depar-
tamento de Antropologia da Universidade da Flórida, Clarence
Gravlee (2020), faz uso do “racismo sistêmico” para compre-
ender como o novo coronavírus afeta em demasia as pessoas
negras e pobres. A teoria da sindemia consiste na sobreposição
de epidemias a outras situações de agravos em saúde em dados
grupos sociais. Dessa forma, a junção dessas variáveis agudiza a
situação ainda mais do que se elas fossem consideradas isolada-
mente. As interações biológicas somadas aos fatores biossociais
entre as epidemias pioram um cenário que já era de extrema vul-
nerabilidade.

No caso da Covid-19, segundo Gravlee, a distribuição desigual
de recursos sociais como moradias dignas, transportes públicos
de qualidade e relações de trabalho mais seguras acarreta uma maior notificação do vírus entre jovens negros e latinos, que mo-
ram em péssimas condições, são alvos preferenciais da violência
policial, têm nível educacional mais precário e relações traba-
lhistas igualmente precárias. Mesmo a noção de comorbidades,
como diabetes e hipertensão, se refere a doenças crônicas de
nível individual, mas com profunda repercussão a nível popula-
cional. A interação entre esses elementos é muito danosa e exi-
ge esforços interdisciplinares. Nesse sentido, parece-nos referir
justamente ao que Butler (2018) nomeou de “precariedade”, constituindo a pandemia em fonte de intensificação delas, em
face da ausência das redes de apoio em saúde, em experiências
de abandono pelo Estado.

Longe de equalizar situações, a Covid-19 serviu para acen-
tuar as tensões e diferenciações sociais ao distinguir quais
trabalhos são passíveis de home office e quais não são, evi-
denciando uma racialização do trabalho, ainda consoante a
Gravlee. A migração da educação para os meios digitais não

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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TOMO. N. 39 JUL./DEZ. | 2021

foi acompanhada da popularização de acesso à internet de
qualidade, então mais diferenças afloram, prejudicando co-
munidades negras e pobres em maioria. Por fim, a tese da sin-
demia observa não só os corpos adoecidos, mas os contextos
sociais mais amplos, que demandam políticas públicas que
não se restrinjam à saúde.

Malgrado tais contribuições sejam bastante relevantes, vamos
nos ater a denominação como “pandemia”, haja vista ser a pers-pectiva hegemônica entre a comunidade científica internacio-
nal, adotada pela Organização Mundial de Saúde até o presente momento. Mas vamos operar com a reflexão acerca da agudi-
zação das precariedades (Butler, 2018) que afetam a vida de comunidades específicas, tendo o Estado, dentre outros atores,
um papel de protagonismo nesse abandono e esfacelamento
de redes de apoio. A seção discutirá a seguir como a pande-
mia acentua desigualdades sociais e revela o modus operandi
do Estado. Ao mesmo tempo que aumenta o número de casos
e mortes na população brasileira, simultaneamente observa-se
como o Estado lida com as diferenças sociais, através de suas
políticas públicas em saúde, inclusive para minorias sexuais. A etnografia das ações do Estado na pandemia tornou-se uma
espécie de laboratório para indagar: quais populações devem
ser reconhecidas como merecedoras de proteção e políticas de
saúde e para quem são vedadas tais políticas de reconhecimen-
to? Quais delas são objeto de atenção em saúde e a quais seg-
mentos ela é negada ou até mesmo impedida, obstaculizada?
Por quais meios isso ocorre, evidenciando exclusões e produ-
ção de margens da política?

3.1 Violência, marcadores sociais da diferença e precariedades

No intento de compreender essas vulnerabilidades, começa-
mos por dados sobre violências, produzidos no âmbito do sis-
tema de informação do Estado, objeto de registros e denúncias

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POLÍTICAS SEXUAIS, SAÚDE E VIOLÊNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19

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feitas no período, que incluem, dentre outras populações, as
pessoas LGBT, mas também as mulheres, os idosos, as crianças
e adolescentes, conforme mostra o Painel de Dados da Ouvido-
ria Nacional de Direitos Humanos, disponibilizado nos canais oficiais do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Hu-
manos (MMFDH). As denúncias são feitas através dos canais oficiais do Governo para registros de ocorrências de violações,
como o Disque 100, o Ligue 180 e o aplicativo Direitos Huma-
nos Brasil.

O Disque 100 foi criado em 1997, como Disque Denúncia Nacio-
nal de Abuso e Exploração Sexual Contra Crianças e Adolescen-
tes, através da coordenação da Associação Brasileira Multidis-
ciplinar de Proteção à Criança e ao Adolescente (Abrapia), em
convênio com o Departamento da Criança e do Adolescente do
Ministério da Justiça. Em 2003, ele foi operacionalizado institu-
cionalmente, se tornando responsabilidade direta do Governo
Federal, de forma interministerial, envolvendo a Secretaria Es-
pecial de Direitos Humanos, o Ministério da Saúde e do Turismo.
Inicialmente criado para receber denúncias de violência relacio-
nadas a crianças e adolescentes, em 2010, foi ampliado e pas-
sou a receber denúncias sobre outros grupos vulneráveis como idosos, pessoas com deficiência, LGBTs, pessoas em situação de
rua, etc.

Ligue 180 é um serviço criado pela Secretaria Nacional de Po-
líticas em 2005, ligado atualmente ao MMFDH, com objetivo de
receber denúncias e reclamações de violência contra a mulher,
oferecer orientação e encaminhamento com base na legislação.
Já o aplicativo Direitos Humanos BR, por sua vez, tem o mes-
mo objetivo que os canais de telefonia, mas com uso privativo
em aplicativo próprio, de modo que o denunciante não preci-
se falar ao telefone. É fruto do aprimoramento em tecnologias,
considerando a convivência entre vítima e agressor no ambiente
doméstico durante a pandemia. É um tipo de resposta por par-
te do Estado, em especial do MMFDH, sendo sua modernização

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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TOMO. N. 39 JUL./DEZ. | 2021

advinda da intervenção da Ministra Damares Alves no combate
à violência doméstica10.

Esses fatos demonstram algumas linhas de atuação do MMFDH no combate a violências, com ênfases específicas. O desenvolvi-
mento de novas tecnologias de registros e mapeamento de dados, a tipificação e a produção de um sistema informacional são avan-
ços. Contudo, oportunamente se analisarão as intervenções no
combate a essas agressões. Eis o panorama que se pode delinear quanto à violência sofrida por grupos vulneráveis específicos.
Só no primeiro semestre de 2020, foram contabilizadas 195.201
denúncias e 1.023.687 violações, distribuídas em todo o terri-
tório nacional. Em 2019, segundo o relatório da Ouvidoria Na-cional de Direitos Humanos (ONDH), foram notificados 159.063
registros através do Disque 100, evidenciando a elevação nos
números11. Dentre os grupos afetados, é notável a violência con-
tra LGBT (1.027, ou seja, 0,52%), mulheres (20.652, ou seja,
10,57%), violência familiar contra a mulher (38.175, ou seja,
19,55%), idosos (46.517, ou seja 23,83%) e contra crianças e
adolescentes (53.525, ou seja 23,83%). Nos estados brasileiros,
São Paulo é o primeiro lugar, com 46.126 denúncias, sendo que
só em maio houve 37.783 denúncias. Sugere o aumento de re-
gistros durante a pandemia. Aqui é crucial destacar os grupos
mais afetados: mulheres, idosos e crianças e adolescentes. Essas
populações são objeto preferencial de violências e violações de

10 Em maio de 2018 foi realizada uma mudança estabelecendo relação entre os canais.
Assim, quando o usuário liga para o Disque 100 sobre a violência contra a mulher é re-
manejado automaticamente para o Ligue 180, sem nova ligação, agilizando procedimen-tos. Os registros descrevem cenário da violação; tipo (física; psicológica; etc.), espécie
(lesão corporal, maus tratos, risco à saúde, ameaça, assédio, etc.); motivação, agravantes
(como, por exemplo, agressor conhecido, agressões prolongadas, violência no âmbito
doméstico, risco de morte, etc.); localidade; população; município; informações sobre
o denunciante; se é situação emergencial e canal de atendimento utilizado (Disque 100,
180 ou Aplicativo Virtual de Denúncias).
11 As denúncias podem revelar violação de direitos humanos, implicados em vítima e
suspeito, sendo que uma denúncia pode indicar uma ou mais violações.

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POLÍTICAS SEXUAIS, SAÚDE E VIOLÊNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19

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direitos na leitura desses registros, durante a pandemia da Co-
vid-19 no país.

Os dados interessam porque queremos saber se e como o Estado
se volta à proteção dessas populações ou se perpetuam formas de
abandono, negligência e desconsideração, em plena pandemia do novo coronavírus. Com fins de aprimorar essa análise, voltamos à
já iniciada discussão sobre vidas precárias e política, recorrendo ao
elaborado pensamento de Judith Butler. As vidas das minorias são
atravessadas por uma avassaladora insegurança objetiva e subjeti-
va, como já ressaltamos. Acerca dessa “precariedade”, Butler (2018)
retoma uma indagação de Theodor Adorno: seria possível viver uma
vida boa em uma vida ruim? Antes de respondê-la, a autora expõe
seus conceitos de “condição precária” e “precariedade”. Para ela,
apesar de haver uma “condição precária” inerente à condição hu-
mana, há uma distribuição desigual dessas condições entre grupos
sociais, sob a batuta de decisões políticas excludentes que designam
quem será mais vulnerabilizado, quais corpos serão mais expostos
à insegurança material e menos protegidos pela estrutura estatal.
A “precariedade” consiste nessa alocação diferencial de recursos de
subsistência e de garantias de direitos:

A “precariedade” designa a situação politicamente induzida
na qual determinadas populações sofrem as consequências
da deterioração de redes de apoio sociais e econômicas mais do que outras, e ficam diferencialmente expostas ao dano, à
violência e à morte. Como mencionei antes, a precariedade
é, portanto, a distribuição diferencial da condição precá-
ria. Populações diferencialmente expostas sofrem um risco
mais alto de doenças, pobreza, fome, remoção e vulnerabili-
dade à violência sem proteção ou reparações adequadas. A
precariedade também caracteriza a condição politicamente
induzida de vulnerabilidade e exposição maximizadas de
populações expostas à violência arbitrária do Estado, à vio-
lência urbana ou doméstica, ou a outras formas de violência
não representadas pelo Estado, mas contra as quais os ins-
trumentos judiciais do Estado não proporcionam proteção e reparação suficientes (Butler, 2018, p. 40-41).

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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Em suma, a precariedade é distribuída desigualmente e aponta quais
vidas não são passíveis de luto (Butler, 2018, p. 106). Dessa forma,
há pessoas cujo estatuto de vida sequer é validado. São consideradas
dispensáveis, descartáveis. A insegurança alimentar e habitacional
ou a descrença em uma rede de amparo social (Butler, 2018, p. 217)
podem ser indicativos dessa experiência de desvalor compartilhada
por tais sujeitos. Mas quais são essas vidas abreviadas com mais
facilidade? De quem são as vidas que não importam como vidas,
não são reconhecidas como vivíveis? Como suas mortalidades pre-
coces são gerenciadas? Para Butler, são resultantes de processos de
“racismo sistemático e de formas de abandono calculado” (Butler,
2018, p. 55), alinhando-se a Singer, reportado anteriormente.

Apesar de “vida boa” ser uma expressão discutível e de múltiplos significados subjetivos, a filósofa questiona como alguém pode
considerar viver tal vida boa num mundo em que essa é estrutu-
ralmente vedada a tantos (Butler, 2018, p. 214). Ademais, como de-
mandar de grupos vulneráveis empenho individual para a consecu-
ção de um status de vida boa? Continua: “Como posso me esforçar
para levar uma boa vida se não tenho uma vida sobre a qual falar,
ou quando a vida que busco levar é considerada dispensável ou, na
verdade, já foi efetivamente abandonada?” (Butler, 2018, p. 218).
Respondendo à pergunta inicial, não é possível viver uma vida eti-
camente boa numa vida projetada estruturalmente para ser ruim. Enfim, é necessário avaliar criticamente as estruturas sociais que
produzem valorações distintas entre os modos de vida. Também é
imperioso que tal vida não seja mera sobrevida, com afagos de vida
boa, mas uma vida vivível, conduzida ativamente pelos sujeitos12.

12 Butler distingue sobre a vida boa, com amparo e redes de apoio, e a vida sobrevivida:
“(...) não podemos lutar por uma vida boa, uma vida possível de ser vivida, sem atender às
exigências que permitem a persistência de um corpo. (...) Ainda assim, essa reivindicação se prova insuficiente, porque sobrevivemos exatamente para viver e porque a vida, por mais
que requeira a sobrevivência para ser uma vida possível de ser vivida. Uma pessoa pode
sobreviver sem que consiga viver a própria vida. E em alguns casos, não parece valer a pena
sobreviver nessas condições. Então, para uma vida possível de ser vivida, ou seja, uma vida
que possa ser vivida, é necessária uma reivindicação mais ampla” (Butler, 2018, p. 229).

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POLÍTICAS SEXUAIS, SAÚDE E VIOLÊNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19

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A reflexão guia nosso olhar nas páginas seguintes, no exame mais
detido das ações do Estado na proteção ou não das minorias, nas
formas de negligência, exemplares de abandono calculado, quando
o assunto diz respeito aos direitos de minorias políticas e sexuais.

3.2 Pandemia, mulheres e negligência do EstadoApesar da declaração oficial da Organização Mundial de Saúde
(OMS) quanto à existência de uma pandemia de Covid-19, em
março de 2020, o Governo Federal de Jair Messias Bolsonaro e
seus Ministérios permaneceram inertes ou protagonizaram uma
série de controvérsias que realçaram o desprezo das autoridades
pela saúde pública. Ao invés de campanhas sanitárias, o Governo
Federal proliferou discursos conspiratórios, incitando uma ati-
tude negacionista em relação à pandemia e contrapondo-se ao discurso das autoridades científicas. E essa tensão tem sido per-
manente. No início, Jair Bolsonaro desestimulou o lockdown e as
medidas de isolamento social propugnadas pela OMS, chegan-
do a promover uma campanha denominada “O Brasil não pode
parar”, posteriormente vetada judicialmente. Tal publicidade se
mostrava mais preocupada com os impactos econômicos dessas
políticas do que com os riscos de sobrecarga no SUS.Diante dessa ineficiência, os governos estaduais e mu-
nicipais organizaram-se para decretar em âmbito local
medidas de distanciamento social, com o aval da justiça,
inclusive, através do julgamento unânime da Ação Direta
de Inconstitucionalidade nº 6341 pelo Supremo Tribunal
Federal, que preservou tal competência dos demais entes
federados.

Depois, o chefe do Executivo passou a defender publicamente a prescrição de medicamento sem comprovação científica de efi-
cácia (cloroquina) contra o novo coronavírus. Tais discordâncias

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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com dois Ministros da Saúde (Henrique Mandetta e Nelson Tei-
ch), ambos médicos, levaram à demissão deles em plena pan-
demia, respectivamente através dos Decretos presidenciais de
exoneração em 16 de abril de 2020 e em 16 de maio de 2020,
no âmbito do Ministério da Saúde, e sua substituição por um mi-
litar, sem formação na área de Saúde e supostamente “especia-
lista em logística”. Esse evento se estendeu para outros cargos
técnicos na pasta e acenou para uma “militarização da Saúde”.
Mais recentemente, o Presidente da República tem promovido
aglomerações e embaraçado a concessão de autorização de vaci-
na, impondo cláusulas mais restritivas.

Muito se falou sobre estarmos no “mesmo barco”, imagem alusi-
va à pandemia que assolou a todos em maior ou menor escala.
Entretanto, essa visão se sustenta diante dos dados? Nesse senti-
do, vejamos mais algumas descrições e relações entre pandemia,
marcadores da diferença, violência e respostas do Estado, dando
destaque para a gestão da negligência e do abandono como uma
certa forma de agir e, deliberadamente, desconsiderar identida-
des coletivas e produzir exclusões e margens na política de saúde.

Em julho de 2020, a imprensa divulgou o alarmante fato do Bra-
sil ser recordista na morte de mulheres grávidas por complica-
ções da Covid-19 devido a falhas no sistema de saúde. Segundo
reportagem de edição do Jornal da Globo News em 30 de julho
de 2020, isso acontece por problemas na assistência que in-
cluem falta de leitos de Unidades de Tratamento Intensivo (UTI)
e tecnologias de cuidados dos casos que exigem “entubação”. O
Brasil registrou, em julho, 77% das mortes de grávidas por Co-
vid-19 no mundo, de acordo com notícia veiculada no Portal G1
em 14 de julho de 2020. Interseccionando pandemia e marca-
dores sociais da diferença, vejamos outros desdobramentos das
decisões estatais.

A política sexual foi afetada quando foram demitidos os coor-
denadores técnicos da Saúde da Mulher e da Saúde do Homem,

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POLÍTICAS SEXUAIS, SAÚDE E VIOLÊNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19

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no Ministério da Saúde, fragilizando a política pública em saúde
com recorte de gênero. Isso aconteceu depois da denúncia da
Ministra Damares Alves de que o Ministério da Saúde abrigava
técnicos supostamente “abortistas” e “feministas” que deveriam
ser afastados, durante uma fala alarmista, na conhecida reunião
ministerial de 22 de abril de 2020, no Palácio da Alvorada, no
Distrito Federal, exibida nos jornais e canais de comunicação
por ordem judicial.

A análise dessa controvérsia demonstrou que a associação entre
conservadorismos e política sexual possui efeitos deletérios na
política de atenção à saúde de mulheres e em especial ao aborto
legal no país, motivada por posturas antifeministas e antiabor-
tistas. Em 5 de junho de 2020, a Jovem Pan noticiou as demissões
na política de saúde de Flávia Andrade Nunes Fialho, coordena-
dora de Saúde das Mulheres, e de Danilo Campos da Luz e Silva,
coordenador da Saúde do Homem, respectivamente através das
Portarias de exoneração nº 1.489 e nº 1.490, de 4 de junho de 2020, publicadas em 5 de junho 2020, no Diário Oficial da União,
assinadas pelo Ministro da Saúde Interino Eduardo Pazuello.

No balanço que procedemos, a situação das minorias em pan-
demia se revelou crítica em muitos outros sentidos lamenta-
velmente. Ainda sobre o marcador gênero e pandemia, histo-ricamente cabe às mulheres o papel de cuidadoras, dos filhos,
cônjuges, pais ou “do lar”. São elas que ainda assumem lugar de ponta em profissões e serviços que foram fundamentais na
pandemia, sendo a maioria no campo da enfermagem, serviço
social, caixas de supermercado, entre outros, tendo permanente
risco aumentado. Isso evidenciou a vulnerabilidade à Covid-19, marcada pela clivagem de gênero. Alguns dados confirmam isso.
De acordo com informação do Conselho Federal de Enfermagem
(COFEN, 2020), 84,7% dos auxiliares e técnicos de enfermagem
que atuam no enfrentamento da Covid-19 são mulheres. Elas re-
presentavam, na região Sudeste, 84,8% dos casos e 63,4% das

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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TOMO. N. 39 JUL./DEZ. | 2021

mortes. No mesmo período, verificamos um considerável au-
mento da violência doméstica durante o isolamento social pre-
conizado pelas autoridades sanitárias brasileiras e pela Organi-
zação Mundial de Saúde, apesar dos tensionamentos de Estados
e municípios com a Presidência da República: as denúncias cres-
ceram em média 14% até abril, conforme mencionamos sobre
dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos. O feminicí-
dio cresceu 22% em 12 estados durante a pandemia. No perío-do, não verificamos ações específicas do Estado no combate à
violência contra a mulher, salvo a adesão do Ministério da Mu-
lher, da Família e dos Direitos Humanos à campanha “Sinal ver-
melho contra a violência doméstica”, promovida pelo Conselho
Nacional de Justiça (2020) e pela Associação dos Magistrados
Brasileiros.

Com foco em farmácias, a iniciativa consistia no incentivo à de-
núncia e acolhimento. As mulheres vítimas de violência domés-
tica poderiam marcar um “X” na mão e exibi-la ao balconista
que, discretamente, acionaria as autoridades policiais. Para tal,
foi disponibilizada uma cartilha com orientações a serem dispo-
nibilizadas nas drogarias.

Mas da parte do Executivo, outras decisões do Estado implica-
ram também abandono e negligência. Como vimos, em 3 junho
de 2020, ocorreu o cancelamento pelo Ministério da Saúde de
nota técnica de serviço de Atenção à Saúde Primária das Mu-
lheres quanto à contracepção, à prevenção da violência sexual
e ao aborto legal na pandemia. Tratava-se da Nota Técnica nº
16/2020 - COSMU/CGCIVI/DAPES/SAPS/MS, de 1 de junho de
2020, cujo assunto era o acesso à saúde sexual e reprodutiva no
contexto pandêmico. Tal nota foi produzida com a colaboração
técnica da Organização Pan-americana de Saúde (OPAS). Os tre-
chos mais polêmicos referem-se às recomendações do Ministé-
rio aos serviços de saúde no tocante à manutenção do acesso à
Saúde Sexual e Saúde Reprodutiva (SSSR), durante a Covid-19,
como: “Garantir e ampliar a oferta de inserção do DIU de cobre

72

POLÍTICAS SEXUAIS, SAÚDE E VIOLÊNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19

TOMO. N. 39 JUL./DEZ. | 2021

nas maternidades, como ação complementar à Atenção Básica,
durante o período pós-parto e pós-aborto imediatos”; “Reiterar
a continuidade dos serviços de assistência aos casos de violência
sexual e aborto legal”; “Portanto, devem ser considerados como
serviços essenciais e ininterruptos a essa população:os serviços
de atenção à violência sexual; o acesso à contracepção de emer-
gência; o direito de adolescentes e mulheres à SSSR e um proces-
so de aborto seguro para os casos previstos em Lei; prevenção e
tratamento de infecções sexualmente transmissíveis, incluindo
diagnóstico e tratamento para HIV/AIDS; (...)”.

Esse grave fato, a exoneração dos coordenadores, afetou o
acesso à saúde das vítimas de violência sexual ao procedimen-
to de aborto legal no país durante a pandemia. Somou-se a ou-
tros eventos, ainda mais dramáticos, exemplares da expulsão
das mulheres vítimas de estupro para as margens da política.
A Portaria nº 2.282, de 27 de agosto de 2020, publicada em
28 de agosto de 2020, do Ministério da Saúde, dispõe sobre o Procedimento de Justificação e Autorização da Interrupção da
Gravidez nos casos previstos em lei, no âmbito do SUS. O do-
cumento, publicado em plena pandemia, tornou a atenção em
saúde às mulheres vítimas de violência sexual um caso de polí-cia! Segundo o documento: “Art. 1º É obrigatória a notificação à autoridade policial pelo médico, demais profissionais de saúde
ou responsáveis pelo estabelecimento de saúde que acolheram a paciente dos casos em que houver indícios ou confirmação do
crime de estupro”.

O que esse fato evidencia são as ações do Estado que operam
para obstrução aos direitos de mulheres, particularmente, das
vítimas de violência sexual, burocratizando o acesso ao aborto
seguro na rede pública. Compreende ato do executivo que age
não para a proteção e redução da precariedade e insegurança
objetiva e subjetiva de vítimas dessa violência, mas para o au-
mento delas, em claro quadro de violação dos Direitos Huma-
nos e Direitos Reprodutivos, nesse caso, do direito de não levar

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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adiante a concepção em situações de violência sexual e estupro,
conforme previsto no ordenamento jurídico brasileiro.

Os acontecimentos narrados só endossam nossa hipótese cen-
tral da violência do Estado no contexto da pandemia da Co-
vid-19, a partir da interferência de certos atores na política pú-blica brasileira, em decisões oficiais de obstrução de direitos, do
abandono e negligência de populações vulneráveis baseadas em
fundamentalismos religiosos e políticos. Aqui, posturas religio-
sas antiabortistas são motivadoras de exclusões na política de
acesso ao aborto legal, afetando o cotidiano das unidades de re-
ferência com novas normatizações técnicas a esse respeito. Veja-
mos outros marcadores da diferença na relação entre pandemia
e respostas do Estado, agora, sobre as pessoas LGBT.

3.3 As pessoas LGBT na pandemia

Sobre a situação de LGBT, na pandemia, outras fontes revelam
fatos relevantes na análise. Uma pesquisa feita pela Universi-
dade Federal de Minas Gerais e pela Universidade Estadual de
Campinas, com 10.256 participantes LGBT, mostrou, em dados
do Portal G1, de 17 de maio de 2020: 21,6% estavam desempre-
gados; 28% com diagnóstico de depressão; 10% problemas no
convívio familiar. Chamou nossa atenção também que a solidão,
decorrente do isolamento social, foi reportada como um pro-
blema de grande destaque entre adultos e idosos LGBT. Pessoas
com 45 a 54 anos (tem 60% a mais de chance de se sentirem so-
zinhas e deprimidas) e com 55 ou mais (80% a mais de chance)
reportaram a solidão como o maior problema, em comparação
com as pessoas LGBT de 15 a 24 anos.

A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) divul-gou dados em 3 de maio de 2020, confirmando que a LGBTfobia
cresceu na quarentena: aumentaram em 49% os homicídios de
pessoas trans, no primeiro quadrimestre, em relação ao mesmo

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período do ano passado. Apesar da sinalização desse crescimen-
to de situações de vulnerabilidade, as ações do Estado para essa questão específica foram poucas ou inexistentes no período. Al-
gumas ocorreram e foram revogadas ou desarticuladas após po-
lêmicas e reações de alguns setores da sociedade, indicando pro-
blemas da assinatura do Estado (Das, 2014) em face de avanços
e recuos que conformam atos de reconhecimento de identidades
coletivas, seguidos de desconsideração e retiradas da assinatura
do poder público, normalmente posteriores às críticas, controvér-
sias e pressões fundamentalistas (Natividade e Oliveira, 2016).

Por exemplo, uma iniciativa do MMFDH contemplou a divulga-ção de uma cartilha específica para LGBT elaborada pelo Minis-
tério, instruindo o home office (sexo virtual) para profissionais
do sexo como parte do controle da doença pelos órgãos do Es-
tado (Universa UOL, 2020), sendo posteriormente retirada de
circulação. Mas havia outras instruções a essa população, apesar
da controvérsia e do recuo subsequente. O material continha in-
formações para trabalhadores autônomos, funcionários de ba-
res e restaurantes e também para pessoas que vivem com HIV
e outras infecções sexualmente transmissíveis (IST). Prescrevia
que essa população vive em contexto de vulnerabilidade social,
devendo fazer uso de medidas preventivas em tempos de pande-
mia. As recomendações vão desde o protocolo estabelecido pela
OMS de isolamento social e outros métodos de prevenção até
evitar compartilhar “bitucas” de cigarro e copos de bebidas. O
uso da tecnologia também foi recomendado para substituir en-
contros pessoais, festas e bares, inclusive: “conversar com seus
clientes para tentar a opção de serviço virtual”, leia-se, sexo vir-
tual. Para os que vivem com HIV ou outras IST,era instruída a intensificação do cuidado, sem interrupção do tratamento e con-
forme as recomendações sanitárias atuais. Na cartilha, era real-
çada a necessidade do preservativo em todas as relações sexu-
ais, sem qualquer alusão a novas tecnologias de prevenção. Não
havia menção a métodos de prevenção para mulheres lésbicas e homens trans, ficando restrita a mensagem a uma generalidade,

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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presumivelmente voltada para grupos de homens heterossexu-
ais, homens gays, travestis, mulheres transexuais e homens que
fazem sexo com homens (HSH).

Para 2020, o MMFDH também estabeleceu um plano de combate à
violência e de inclusão no mercado de trabalho para a comunida-
de LGBT. Segundo matéria no site ministerial, em 27 de janeiro de
2020, a ação faz parte do “Pacto Nacional de Enfrentamento à Vio-lência LGBTfóbica”. O pacto foi estabelecido com a finalidade de de-
senvolver ações conjuntas entre Governo Federal, estados e muni-
cípios de combate à violência contra esse segmento. As estratégias
partem da disponibilização de dados estatísticos sobre a violência
aos LGBT, reforço de denúncias através do Disque 100 e da cria-
ção de um Observatório Nacional de Denúncias de LGBTfobia para
realizar o acompanhamento das denúncias em função da violência
e casos de mortes, segundo informação do Portal do MMFDH. Es-ses são dados oficiais de órgãos do Estado que não foram objeto de nossa etnografia. Por ora, destacamos a queixa de movimentos
locais quanto à exclusão do diálogo com o Governo, em razão da
relação prioritária estabelecida com um pequeno número de sujei-
tos. Tal interação vem sendo criticada, sobretudo, quanto ao caráter
despolitizado, restrito a parcerias e dotações orçamentárias, sem
abarcar críticas ao Governo, diante do desmonte de políticas.

O registro de dados sobre violência LGBT é objeto da reação de
segmentos da sociedade civil, em especial de coletivos como
o Grupo Gay da Bahia (GGB), em relatório sobre a magnitude
da homofobia no país. A esse respeito, comenta o GGB que dos
297 homicídios de LGBT contabilizados pelo grupo, somente 84 foram capturados pelas estatísticas oficiais do Governo em 2019. A crítica referenda a baixíssima cobertura oficial sobre a
violência LGBTfóbica, inclusive por falhas nos sistemas de dados demográficos dos órgãos competentes do Estado brasileiro. A
inexistência de contagem da população LGBT por parte do Ins-tituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) impossibilita
comparações e acompanhamentos ponderados, ou seja, mais re-

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finados, da evolução da violência contra LGBT no Brasil ao longo
do tempo, conforme informa o Anuário Brasileiro de Segurança
Pública 2020, documento disponível no Fórum Brasileiro de Se-
gurança Pública (FBSP).

Já o tema da empregabilidade foi abordado pela suposta criação
de um Grupo de Trabalho (GT) no MMFDH, voltado para cons-
trução de um Programa Nacional de Empregabilidade LGBT. A
prioridade seria combater a exclusão de travestis e transexuais
no mercado de trabalho e propor projetos e diretrizes de políti-
cas públicas nesse sentido. Também aqui despontam dissensos,
inconformidades e críticas de coletivos e indivíduos LGBT sobre
como tal pauta do MMFDH compreende a moralização e higieni-
zação da política LGBT. Para além da empregabilidade, a queixa
é que não se têm discutido políticas de segurança pública para
trans que se prostituem nas ruas, deixando-as relegadas à cate-
goria de pessoas de segunda classe, não merecedoras de amparo
estatal devido ao exercício da prostituição como atividade labo-
ral. Conforme vimos, algumas linhas de ação para LGBT pare-
cem ter se desenvolvido. Contudo, necessitam do conhecimento
antropológico em suas ações, direcionamentos, conteúdos, para além do anúncio em fontes oficiais.
4. Considerações finais:

O artigo discutiu temas caros à sociedade brasileira, no que
concerne ao campo da governança pública e acesso de distin-
tas populações à assistência em saúde, por meio de uma re-flexão particular sobre políticas sexuais. Colocou em debate a configuração de determinadas relações entre Estado e grupos
vulneráveis, nos termos da produção de certas formas de con-
ceber a relação entre sexo, gênero e política. Realçou o modo
como alterações técnicas impactaram o desenho das políti-
cas públicas, no atual quadro político brasileiro, ocasionando
falhas nos serviços de atenção em vários campos: HIV/AIDS,

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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Direitos Reprodutivos (aborto legalizado); proteção de popu-
lações LGBT. etc.

A pandemia da Covid-19 no país, contexto de produção de parte
dos dados da pesquisa ampla que fornece os dados desta análise, aparece no artigo como mote de uma discussão específica sobre a
violência do Estado e certas formas de gerenciar e escolher quais
vidas valem e devem ser objeto de políticas e atenção do Estado e
quais não são validadas como vidas, entregues ao abandono e exclu-
ídas da preocupação com sua proteção. A negligência e abandono
do Estado são tratados como parte desse processo mais amplo de
racismo, machismo e LGBTfobia estruturais e sistêmicos que am-
param as decisões do Estado, inclusive na composição de quadros
gestores e técnicos de modo a, intencionalmente, obstruir direitos e acesso a serviços, programas e políticas específicas.
Inventariamos as relações entre marcadores sociais da diferen-ça e ações do Estado em tempos de pandemia, identificando ten-
sionamentos, ocultações e zonas de exclusão. Destacamos como
mudanças técnicas nos quadros gestores produzem alterações
qualitativas nos conteúdos das políticas, fazendo desaparecer
identidades coletivas como pessoas que vivem com HIV, LGBT,
mulheres vítimas de violência sexual, dentre outras, dos meca-
nismos políticos de consideração do Estado na proposição de ações de proteção social e configuração de serviços e assistência
que integram redes de apoio estatais.

Do ponto de vista dos conteúdos, parte das políticas e campanhas
analisadas manifesta mensagens generalistas, menos direcionadas a segmentos específicos e com ênfases e tonalidades menos infor-
mativas e mais moralistas. Permeia parte dessas políticas discursos
e narrativas muito criticáveis por reproduzir estereótipos e operar
pela política do medo. Na política de AIDS, ao invés de tornar a pre-
venção um assunto natural, cotidiano e informativo, opera-se com
as mensagens que reforçam o medo e ideias de grupos e comporta-
mentos de risco, reavivadas durante a pandemia.

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O tema da saúde sexual apareceu envolto em alertas de “risco” e
menos em informação em saúde sexual e suas novas tecnologias.
A assinatura do Estado está manchada por essa escrita preconcei-
tuosa e que representa retrocessos nas formas de falar e informar
em saúde sexual na sua historicidade. Combater preconceitos e
estereótipos parece que não está mais nessa pauta, mas produ-
zir alertas e alarmes sobre pessoas e comportamentos perigosos.
Essa narrativa acentua pânicos morais já desconstruídos nas lutas contemporâneas que fizeram avançar as políticas sexuais.Verificamos a existência de linhas de ação implicadas em formas de atuar específicas, em relação a grupos LGBT, mulheres e ou-
tras populações vulneráveis. Existem ações internas ao MMFDH
associadas à sistematização de informação sobre violência LGB-
Tfóbica e outras, incluindo a modernização de registros e sis-
tematização de informações sobre essa violência. Todavia, não ficaram nítidas as formas de atuar para combater a violência. O
tema é tratado restritamente, resignando-se ao levantamento de informações, sem muita definição das linhas concretas de inter-
venção. Por exemplo, no monitoramento dos atos do Estado está
ausente a preocupação com o combate à LGBTfobia por meio de
processos educacionais e ações em gênero e sexualidade na es-
cola, formação de professores da rede pública em direitos huma-
nos, etc. Notou-se silêncio sobre políticas de gênero e diversida-
de na escola, educação em direitos humanos, etc. Apesar disso,
foi noticiada a formação de Grupo de Trabalho para a discussão
da empregabilidade LGBT como uma das preocupações centrais
do MMFDH, parte de seus ideais moralizadores.

Nesse sentido, também observa-se o estreitamento do diálogo
desse Ministério com grupos conservadores. Em 8 de agosto de
2019, a Ministra Damares Alves recebeu para conversa e alinha-
mento de ações grupos de cura gay, conforme informa matéria
da Agência Pública (2020) sobre a atuação de redes de cura gay
na América Latina, incluindo o Brasil, como ambiente acolhedor
desse tipo de assistência religiosa LGBTfóbica. Assim, é notável

Marcelo Tavares Natividade; Bruno Alves de Sousa; Rômulo do Nascimento Rocha

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o modo como conservadorismos e fundamentalismos políticos e
religiosos perpassa as redes do Estado, adentrando os seus cen-
tros de poder e conformando políticas públicas e suas mensa-
gens e discursos.

Para além da pauta LGBT e suas contradições, observaram-se os
tensionamentos com a política de aborto legalizado e políticas de igualdade de gênero e suas reflexões acerca dos usos do cor-po. Verificou-se que a forte ênfase antiabortista ameaça direitos
de vítimas de violência sexual e estupro. Narrativas antifeminis-
tas são produzidas em alertas contra a presença de supostas ati-
vistas feministas nas redes estatais, preconizando exonerações,
transferências, desligamentos e mudanças em quadros técnicos
gestores. Tais polêmicas, infelizmente, se desdobram em pro-blemas e ações do Estado que dificultam o acesso a serviços de
referência para interrupção de uma gravidez indesejada, decor-
rente de estupro ou violência sexual. A análise feita discutiu os
impactos desses alarmes fundamentalistas no acesso a essa po-
lítica de atenção à saúde sexual dessas mulheres e a assinatura
do Estado na obstrução do aborto de forma legal. Sobre os cor-
pos femininos pairam e agem a violência do estupro e a violência
do Estado.

O artigo também levantou e discutiu inclusões e exclusões de
distintas minorias na agenda da política de saúde do governo
durante a atual pandemia. Indicou a pouca efetividade nas ações
que pudessem minimizar as precariedades objetivas e subjeti-
vas. E focalizou o abandono e a negligência, a intencionalidade
de produzir corpos desperdiçáveis e vidas indignas de proteção. Enfim, tantas zonas de silêncio nos instigam a prosseguir nes-
sa investigação acerca das linhas ideológicas perpetuadas pelos
atuais quadros técnicos do Governo Federal e seus ministérios,
as controvérsias, os tensionamentos, as ausências, os recuos e
retrocessos, as obstruções, as dinâmicas de instabilidade que
atravessam a relação entre políticas sexuais, vulnerabilidades,
direitos humanos e Estado.

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POLÍTICAS SEXUAIS, SAÚDE E VIOLÊNCIA EM TEMPOS DE PANDEMIA DA COVID-19

TOMO. N. 39 JUL./DEZ. | 2021

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Recebido em 05/02/2021
Aceito em 31/05/2021